A 11ª rodada do Campeonato Brasileiro foi marcada por atos de vandalismo e desordens nos estádios de futebol, destacando-se as torcidas das equipes do Santos Futebol Clube e do Club de Regatas Vasco da Gama, que protagonizaram atos de violência após as derrotas nos jogos [1].
Infelizmente, o grande tumulto causado por torcidas não é incomum no futebol brasileiro, havendo uma extensa lista de clubes punidos em decorrência de atos de vandalismo e violência. Mas afinal, qual é a responsabilidade dos clubes nesses casos e onde está prevista a punição?
No Brasil, a legislação aplicável aos casos de infrações disciplinares desportivas no futebol profissional é o Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD) [2]. O artigo 211 desse código estabelece a responsabilidade dos clubes em manter o local indicado para a realização dos eventos com a infraestrutura necessária para assegurar a segurança. A inobservância dessas obrigações pode acarretar ao infrator uma pena de multa que varia de R$ 100 a R$ 100 mil, podendo, em casos mais graves, ocorrer a interdição do estádio.
Além disso, o artigo 213 do CBJD também prevê punições para os clubes que deixam de tomar as providências necessárias para prevenir e reprimir desordens nos estádios, invasões de campo e lançamento de objetos. Nesses casos, os clubes podem ser multados no valor de R$ 100 a R$ 100 mil e ainda sofrer a perda do mando de campo de uma a dez partidas.
Podemos citar alguns exemplos de casos em que os clubes foram punidos de acordo com a legislação vigente. No ano de 2019, o Cruzeiro Esporte Clube foi multado em R$ 50 mil e teve a perda de três mandos de campo com portões fechados devido a atos de violência, desordens, brigas e vandalismo ocorridos no Mineirão após a decretação do seu primeiro rebaixamento da história [3]. Essa infração se enquadrou no artigo 213 do CBJD.
Em 2013, o jogo entre Atlético-PR e Vasco foi marcado por uma briga generalizada entre as torcidas, resultando na condenação do Atlético-PR pelo Tribunal Pleno do Superior Tribunal de Justiça Desportiva do Futebol (STJD). O clube foi punido com a perda de mando de campo em nove jogos, sendo quatro com portões fechados, e multado em R$ 80 mil. O Vasco também recebeu uma penalidade de seis partidas com a perda do mando de campo em três delas, além de uma multa de R$ 50 mil [4].
Em outro infeliz incidente ocorrido em 2009, o Coritiba Foot Ball Club foi punido com a perda de mando de campo em dez partidas, juntamente com uma multa de R$ 100 mil, devido a atos de desordens e tumultos ocorridos no estádio Couto Pereira.
Atualmente, em decorrência dos inúmeros casos de desordens provocadas pelas torcidas, os Regulamentos de Competição da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) foram atualizados, prevendo formas de mitigar a ocorrência das infrações disciplinares com punições mais severas.
Prova disso, foi a recente decisão do STJD que determinou jogos com portões fechados por 30 dias em São Januário (estádio do Vasco) e na Vila Belmiro (estádio do Santos Futebol Clube) [5], em decorrência dos distúrbios ocorridos nas partidas ocorridas pela 11ª rodada do Campeonato Brasileiro [6].
Isso porque o artigo 79 do Regulamento de Competições de 2023 permite que nos casos de violência e distúrbios graves, com fundamento no artigo 175, § 2º, do CBJD e no Código Disciplinar da Fifa, as partidas correspondentes à pena de perda de mando de campo poderão ser realizadas, por determinação do STJD, no mesmo estádio em que o clube manda seus jogos, com portões fechados ao público, vedada a venda de ingressos [7].
Além da sanção disciplinar, em que os torcedores são impedidos de comparecer ao estádio para acompanhar os jogos dos seu clube, a sanção financeira é a que mais abala as equipes, já que não auferem renda com a venda dos ingressos [8].
Esses casos exemplificam a aplicação rigorosa das sanções previstas no CBJD e Regulamentos de Competições, visando justamente coibir a reincidência de comportamentos violentos, bem como garantir a segurança nos estádios. É fundamental que os clubes assumam sua responsabilidade na manutenção da ordem e adotem medidas efetivas para prevenir e reprimir atos de violência por parte de suas torcidas.
Além das punições mencionadas, é importante ressaltar que as autoridades competentes, como as polícias militar e civil, também desempenham um papel essencial na garantia da segurança nos eventos esportivos. A atuação conjunta entre clubes, torcedores, órgãos de segurança e as instâncias jurídicas é fundamental para a promoção de um ambiente saudável e pacífico nos estádios.
Cabe também aos advogados especializados em Direito Desportivo auxiliar os clubes na compreensão e cumprimento das normas disciplinares, bem como na defesa de seus interesses em casos de infrações disciplinares desportivas. A atuação jurídica adequada e o conhecimento das leis desportivas são fundamentais para garantir a proteção dos direitos dos clubes e contribuir para a construção de um ambiente esportivo seguro e livre de violência.
REFERÊNCIAS
Código Brasileiro de Justiça Desportiva. Superior Tribunal de Justiça Desportiva. Disponível em: https://conteudo.cbf.com.br/cdn/201507/20150709151309_0.pdf
LEME, Tiago. STJD diminui punições a Atlético-PR e Vasco por briga de torcedores em Joinville. Rio de Janeiro, 06 fev. 2014. ESPN. Disponível em: http://www.espn.com.br/noticia/387477_stjd-diminui-punicoes-a-atletico-pr-e-vascopor-briga-de-torcedores-em-joinville
MENDES, Rodrigo. Santos e Vasco sofrem punições do STJD após tumultos em estádios. GP1 Esporte, 24 de jun. 2023. Disponível em: https://www.gp1.com.br/esportes/noticia/2023/6/24/santos-e-vasco-sofrem-punicoes-do-stjd-apos-tumultos-em-estadios-550580.html#:~:text=Os%20epis%C3%B3dios%20ocorreram%20depois%20das,que%20vivem%20momentos%20de%20instabilidade.&text=O%20Santos%20e%20o%20Vasco,sem%20torcida%20por%2030%20dias
Regulamento Geral das Competições – 2023. Confederação Brasileira de Futebol. Disponível em: https://conteudo.cbf.com.br/cdn/202302/20230214221219_73.pdf
RIO DE JANEIRO. Superior Tribunal de Justiça Desportiva do Futebol. Processo: 027/2020. Relator: Aud. José Perdiz de Jesus. Rio de Janeiro, 09 jun. 2020. Disponível em: https://conteudo.cbf.com.br/cdn/202006/20200617124109_51.pdf
Santos pode deixar de arrecadar R$ 2 milhões após punição. Terra. Disponível em: https://www.terra.com.br/esportes/santos/santos-pode-deixar-de-arrecadar-r-2-milhoes-apos-punicao,211ceae0b1309932c9ac81d2cb1c09502kn5f25b.html
STJD determina jogos com portões fechados em São Januário por 30 dias. Superior Tribunal de Justiça Desportiva, 23 de jun. 2023. Disponível em: https://www.stjd.org.br/noticias/stjd-determina-jogos-com-portoes-fechados-em-sao-januario-por-30-dias
STJD determina jogos com portões fechados na Vila Belmiro por 30 dias. Superior Tribunal de Justiça Desportiva, 23 de jun. 2023. Disponível em: https://www.stjd.org.br/noticias/stjd-determina-jogos-com-portoes-fechados-na-vila-belmiro-por-30-dias
Bruno Meneses Alves Faria é advogado com especialização em Gestão Esportiva pela FGV/Fifa/Cies, especializado em Gestão do Futebol pela CBF Academy, presidente da Comissão de Direito Desportivo da Seção OAB-MG, pós-graduado em Direito do Trabalho pela PUC-MG e advogado com especialização em Negócios no Esporte e Direito Desportivo pelo Cedin.
Douglas Sanguinete Ribeiro é advogado com especialização em Negócios no Esporte e Direito Desportivo pelo Cedin.