Oferta da Unipar pela Braskem desafia Direito Concorrencial

A proposta de compra da Braskem pela Unipar tem de tudo para se tornar um dos principais desafios recentes do Direito Concorrencial. A começar pelo tamanho das duas empresas, que já são, individualmente, as duas maiores do setor petroquímico do país. Justamente por isso, especialistas ouvidos pela ConJur enxergam uma série de obstáculos a serem superados no negócio.

A Unipar ofereceu R$ 10 bilhões à Novonor (antiga Odebrecht) para assumir o controle da Braskem — a empresa é dona de 38,3% do capital total e 50,1% do capital votante. A transação ainda depende da Petrobras, que tem 36,1% da companhia e o direito de preferência para ampliar sua participação nas mesmas condições.

FreepikTransação entre gigantes petroquímicas terá que passar pelo Cade

Caso se concretize, a transação eliminaria uma empresa em um setor que já é naturalmente seleto em função da alta demanda por investimentos e intensidade de capital. Poucas companhias têm capacidade de fazer frente a esta demanda. E Braskem e Unipar são duas delas. 

Para se ter uma ideia, no mercado de PVC, a nova empresa teria 100% da participação de mercado. A Unipar estaria disposta a abrir mão desta divisão para viabilizar o negócio e obter o aval do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Um observador deste mercado comenta, porém, não ser raro que as empresas não consigam executar as exigências do órgão, como não encontrar compradores para a divisão que precisa ser vendida. 

“É uma operação que apresenta potenciais riscos concorrenciais. Está se discutindo a formação de um monopólio”, afirmam os advogados José Del Chiaro e Luiz Felipe Rosa Ramos. “Note-se que, mesmo em outros mercados onde a concentração não é 100%, pode haver preocupação concorrencial relevante. A questão que surge é quais e como serão definidos os ativos e linhas de produtos a serem desinvestidos. Segundo se noticia, o ativo de PVC não seria o principal obstáculo para desinvestimento”, acrescentam.

O advogado Marcos Manoel, coordenador do Núcleo de Direito Empresarial e Negócios do Nelson Wilians Advogados, acrescenta que esta é uma solução que dependerá do tamanho da fatia de mercado ocupada por outras empresas do setor. “Se estas empresas adquirem tais ativos, haveria de se avaliar se o ambiente concorrencial livre de um monopólio ou de um oligopólio restaria reestabelecido”. 

“Essencialmente, o Cade irá analisar a sobreposição em todos os mercados possíveis. Dado o modelo de funcionamento do setor petroquímico, a probabilidade de sobreposição ir além de PVC é muito grande”, afirma Paulo Furquim, professor do Insper. Ele acrescenta que, no caso do PVC há um agravante: “O PVC foi considerado pelo Cade um mercado doméstico, que se retringe às fronteiras do Brasil. A própria Braskem já foi impossibilitada de comprar uma empresa no passado. Com a Unipar, essa dificuldade seria até maior.”

Outra saída em avaliação pela Unipar é dividir ativos da Braskem com a Petrobras, que sairia da sociedade. A estatal, por enquanto, não comenta o negócio e não se descarta, inclusive, a possibilidade de que ela exerça seu direito de preferência para assumir o controle. O obstáculo aqui é que a Petrobras detém o monopólio da nafta, principal insumo da petroquímica. “Se a Petrobras passasse a controlar a Braskem, poderia restar configurado um ato de concentração vertical”, diz Manoel.

Nessa hipótese, Furquim não vê grandes obstáculos, porque a Petrobras não é concorrente da Braskem, mas fornecedora. “Além disso, acho que torna a operação menos preocupante o fato de a Petrobras já ser uma acionista muito grande dentro da Braskem.”

Del Chiaro e Luiz Felipe Rosa lembram que o direito de preferência da Petrobras também tem de ser submetido ao Cade. “Neste aspecto, existe um fator complicador: a localização física das plantas em polos petroquímicos, o que pode dificultar eventuais desinvestimentos, mas que traz também o agravante da dificuldade no abastecimento dos insumos”, afirmam.

Mesmo a hipótese de se retirar a Petrobras da Braskem, levando parte dos ativos para se dar origem a uma nova companhia, pode não servir para viabilizar o negócio. “Este modelo poderia configurar um ato de concentração vertical que caracterize uma infração à ordem econômica, também pelo fato de que poderia formar um oligopólio entre duas empresas”, alerta Manoel. 

“O ingresso de uma nova refinaria com condições de produzir a nafta, em eventual remodelação da Braskem, surge como hipótese a ser ponderada, desde que a saída da Petrobras seja efetiva e não apresente riscos de coordenação entre as entidades a serem formadas”, afirmam Del Chiaro e Luiz Felipe. 

Furquim observa ainda não estar claro quais ativos a Petrobras tiraria da Braskem. “Se estão falando de desinvestimento, que seria separar um pedaço da Braskem para não concorrer com a Unipar, pode ser um remédio razoável. Mas um coisa que se discute é se essa nova parte tem substância econômica para ser autônoma e lucrativa para viver como empresa. Não é tão simples fazer isso”, analisa.

“A preservação de concorrência é o objetivo da análise do Cade, a modelagem dessa operação pode trazer alguns benefícios para o mercado. Todavia, o Cade, deverá, em qualquer cenário, assegurar concorrência em toda a cadeia, não só evitando concentrações excessivas como também atentando para eventuais riscos de fechamento de mercado decorrente da participação de empresas do grupo em mais de um elo da cadeia”, concluem Del Chiaro e Luiz Felipe.

Consultor Júridico

Facebook
Twitter
LinkedIn
plugins premium WordPress

Entraremos em Contato

Deixe seu seu assunto para explicar melhor