A possibilidade de abertura, ainda que em fase instrutória, do processo administrativo disciplinar contra o desembargador José Carlos Costa Netto incomodou colegas do magistrado no Tribunal de Justiça de São Paulo. Desembargadores e fontes com ótimo trânsito na corte afirmam que atos como esse permitem a entrada da politização nas turmas designadas para julgar ações empresariais.
O PAD contra Costa Netto foi iniciado no dia 17 deste mês, quando o presidente do TJ-SP, Ricardo Anafe, deu 15 dias para o desembargador apresentar defesa prévia. O processo disciplinar foi solicitado pela empresa indonésia Paper Excellence, que trava com a J&F Investimentos uma disputa pelo controle da Eldorado Brasil Celulose.
Ainda que a decisão final sobre a abertura do procedimento caiba ao Órgão Especial do TJ-SP, o pedido da Paper já estremeceu algumas relações no tribunal. Além da já mencionada politização, há dois outros precedentes que podem ser abertos a partir desse episódio: o primeiro é o fato de os magistrados se tornarem alvos de investigação interna simplesmente por decisões que foram provocados a tomar; o segundo é a possibilidade de se usar a esfera disciplinar como esfera recursal.
Outro motivo de desconforto foi o vazamento do teor da decisão de Anafe à imprensa. Colegas entendem que, por mais que se discorde das decisões de Costa Netto, ele ficou exposto publicamente por decisões que tomou em um caso complexo. Processos disciplinares são, via de regra, sigilosos desde a origem. Após a entrega da defesa de Costa Netto, caberá ao próprio presidente do TJ-SP decidir se envia o caso para julgamento do Órgão Especial ou arquiva a reclamação.
Segundo fontes que tiveram acesso ao relatório, o documento assinado por Anafe o coloca numa situação delicada entre os pares, por ser considerado “uma sentença condenatória”. Mas ainda caberá ao presidente do TJ-SP arquivar ou não o PAD.
Entenda
Costa Netto é relator de um conflito de competência para decidir quem será o magistrado responsável pelos processos relacionados à Eldorado, entre eles um recurso que tenta anular o procedimento arbitral que deu à Paper o direito de assumir a fábrica. A J&F aponta na Justiça vícios que devem invalidar a arbitragem, como a violação do dever de revelação de um dos árbitros e a espionagem que sofreu durante o processo.
Enquanto o conflito de competência não se resolve, Costa Netto manteve suspensos os processos relacionados para evitar decisões conflitantes ou que pudessem ser contestadas em razão da potencial mudança de relatoria.
O Grupo Especial da Seção de Direito Privado do TJ-SP já havia confirmado a validade das decisões de Costa Netto. A Paper ainda tentou recorrer ao Órgão Especial do TJ-SP, instância máxima da corte, em dois mandados de segurança. Nos dois casos, os pedidos da empresa foram negados, confirmando que o desembargador tinha jurisdição para proferir as decisões contestadas.
Agora, em uma nova escalada da disputa, a empresa indonésia apresentou uma reclamação disciplinar que, no limite, pode custar o cargo do desembargador. A Paper acusa Costa Netto de agir com parcialidade e ilegalidade na relatoria do conflito de competência, função que assumiu em razão de sorteio.