O ajuizamento de dezenas de ações padronizadas contra jornalistas de uma mesma publicação com o intuito de retaliação e imposição de mordaça representa abuso do direito de acesso à Justiça e fere a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
Com esse entendimento, e por maioria de votos, o Plenário do STF julgou procedente uma reclamação constitucional e derrubou uma série de processos movidos por juízes contra o jornal Gazeta do Povo e jornalistas que atuam ou atuaram no veículo.
As ações seriam uma retaliação contra uma série de reportagens publicada pelo jornal mostrando que juízes e promotores recebem salários abaixo do teto, mas se beneficiam de auxílios e benefícios como forma de “indenização”, que não se submetem a esse limite.
Todos os processos estão paralisados ou com seus efeitos suspensos desde 2016, por decisão da ministra Rosa Weber. A alegação dos autores da reclamação é de que o objetivo é punir jornalistas e empresa e, assim, evitar novas reportagens desfavoráveis ao Judiciário do Paraná.
Votaram com a relatora os ministros André Mendonça, Cristiano Zanin, Edson Fachin, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso.
Abriu a divergência e ficou vencido o ministro Alexandre de Moraes, seguido pelo ministro Kassio Nunes Marques.
ADPF 130
As ações foram derrubadas por meio de reclamação constitucional. O STF entendeu que elas ofenderam o que a corte decidiu na ADPF 130, em que declarou inconstitucional a Lei de Imprensa de 1967, aprovada sob uma ótica cerceadora da liberdade de expressão e que permitiria tais exercícios judiciais.
Relatora, a ministra Rosa Weber apontou que as ações são padronizadas, foram ajuizadas em um diminuto espaço de tempo e em diferentes comarcas, o que só foi possível porque os autores escolheram usar os Juizados Especiais.
Com isso, jornal e jornalistas se viram obrigados a lidar com audiências em diversas comarcas paranaenses em datas e horários próximos, senão simultâneos, o que indica uma ação dolosa para prejudicar o exercício do fundamental do direito de defesa.
“Nesse diapasão, e porque independente de configuração de culpa, entendo caracterizada, no caso dos autos, a prática do exercício disfuncional — e ilegítimo — do direito de ação em desfavor dos ora reclamantes, utilizada com o propósito intimidatório da imprensa”, afirmou a ministra.
Ação antecipada
Abriu a divergência o ministro Alexandre de Moraes, com base em óbices processuais. Em sua análise, o uso da reclamação é inviável porque, quando ela foi ajuizada, não havia nenhum ato decisório proferido pelos juízos reclamados.
“Ou seja, no momento em que provocada a corte, não seria possível sequer falar em eventuais violações aos paradigmas apontados como violados, tendo em vista a ausência de qualquer manifestação de méritos.”
Assim, segundo Alexandre, o receio do jornal e dos jornalistas sobre a possibilidade de os juizados ferirem o que o STF decidiu na ADPF 130, ainda que justo e fundado, não autoriza que eles usem a reclamação constitucional para acionar o tribunal.
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