Washington Reis: Aditamento à inicial do processo do trabalho

O processo do trabalho encontra-se em constante evolução e adaptação, restando eventual dúvida de quando e como será aplicada a norma processual civil à sistemática trabalhista, sem ferir os direitos básicos das partes.

O sistema processual como um todo é o meio adequado para resolução de uma lide. Através dele, as partes poderão fazer suas alegações, produzir provas, requerer depoimento da parte contraria, ou seja, dispor de mecanismos para convencer o magistrado das suas argumentações.

Assim, para não eternizar o processo, o legislador criou meios de estabilização processual, momento que fases processuais são concluídas e, por consequência passamos para um novo ciclo processual (artigo 347 do CPC).

A primeira estabilização processual trabalhista finaliza com o saneamento processual pelo magistrado que é feita em sede de audiência, tendo como atos anteriores a proposta da petição inicial, citação da reclamada e posterior apresentação de contestação (artigo 841 da CLT). Podendo a contestação ser apresentada pela reclamada de forma escrita eletronicamente pelo (PJE) ou oral em sede de audiência (artigo 847 da CLT). (PEREIRA, 2020).

Dessa forma, antes da referida estabilização é perfeitamente possível que o requerente apresente um aditamento a sua petição inicial, como forma de acrescentar, alterar ou extinguir causa de pedir e/ou pedidos, colecionados anteriormente a sua petição inicial (artigo 329 do CPC).

Devemos lembrar que, o aditamento à inicial é requerido pelo autor voluntariamente, enquanto a emenda à inicial é determinada pelo magistrado para sanar eventuais vícios trazidos na petição inicial.

Deste modo, o artigo 329 do Código de Processo Civil é quem vai nos dizer o momento adequado para dispor do aditamento da petição inicial, In fine:

“Artigo 329. O autor poderá:

I – até a citação, aditar ou alterar o pedido ou a causa de pedir, independentemente de consentimento do réu;

II – até o saneamento do processo, aditar ou alterar o pedido e a causa de pedir, com consentimento do réu, assegurado o contraditório mediante a possibilidade de manifestação deste no prazo mínimo de 15 (quinze) dias, facultado o requerimento de prova suplementar.

Parágrafo único. Aplica-se o disposto neste artigo à reconvenção e à respectiva causa de pedir.”

Convém destacar, a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil a CLT, (artigo 8 da CLT e artigo 15 do CPC).

Não obstante, no Processo Civil, o saneamento processual é feito anterior a audiência de instrução, oportunidade que o Juiz fará a organização processual (artigo 357 do CPC). (DONIZETTI, 2017).

Vale lembrar que, a rigor o Código de Processo Civil estipula que o prazo para apresentação da contestação, sendo de 15 dias (artigo 335 do CPC), a contar da audiência de conciliação ou mediação, do pedido de cancelamento desta audiência pelo réu, ou da citação do réu em conformidade com o artigo 231 do CPC.

Por outro lado, no processo do trabalho a contestação é recebida em audiência, que como dito, trata-se do momento que o Magistrado realiza o saneamento processual, analisando a petição inicial, recebendo a contestação e podendo determinar ao reclamante que faça uma eventual emenda à inicial, isto é, que o reclamante corrija alguma irregularidade constante na sua petição inicial (Súmula 263 do TST).

Tal medida de reparo de irregularidade somente terá validade no processo do trabalho se não implicar em prejuízo a parte contraria (artigo 794 da CLT) com base no princípio da validade dos atos processuais.

Outra distinção do processo civil e processo do trabalho é a citação do réu. O CPC no seu artigo 231 vai discorrer que o prazo para manifestação do réu contará a partir da juntada da citação ou mandado cumprindo nos autos, quando esta citação for feita por correios ou oficial de justiça.

Em contrapartida, no processo do trabalho a citação será presumida recebida pela reclamada em 48 horas, após sua postagem, tendo a reclamada o ônus de provar o seu não recebimento (Súmula, 16 do TST).

Logo, podemos perceber que há uma singela distinção entre o processo civil e processo do trabalho. Vista disso, surge a dúvida se podemos aplicar o artigo 329 do CPC de forma literal ao processo do trabalho? Ou devemos enquadrá-lo a realidade trabalhista? Isso porque, com aplicação do referido artigo qualquer aditamento posterior a 48 horas, seria inviável na esfera trabalhista.

O tema não se encontra pacificado na jurisprudência e doutrina trabalhista. O TST na sua IN 39/2016, deixou em aberto a discussão do tema, gerando na justiça trabalhista decisões que ora versam a favor e ora contra a aplicação do artigo 329 do CPC ao processo trabalhista, com o fundamento de falta de previsão legal e aplicação subsidiária do CPC ao processo trabalhista.

Entretanto, o TST vem se posicionando reiteradas vezes sobre a temática, afastando o artigo 329 do Código de Processo Civil e, com isso, oportunizando que o reclamante faça o aditamento à inicial, mesmo que já tenha existindo a citação da reclamada, in verbis:

“NULIDADE PROCESSUAL. ADITAMENTO DA PETIÇÃO INICIAL APÓS A CITAÇÃO. PROCESSO DO TRABALHO. POSSIBILIDADE. Constatada possível violação ao artigo 5º, LIV, da Constituição Federal, dá-se provimento ao agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista. RECURSO DE REVISTA DO AUTOR. LEI Nº 13.467/2017 . TRANSCENDÊNCIA ECONÔMICA DA CAUSA RECONHECIDA . NULIDADE PROCESSUAL. ADITAMENTO DA PETIÇÃO INICIAL APÓS A CITAÇÃO. PROCESSO DO TRABALHO. POSSIBILIDADE. Na regra processual comum (artigo 329 do CPC), o aditamento da petição inicial, com alteração do pedido ou da causa de pedir, sem anuência da parte adversa, é admitido até a citação, momento a partir do qual corre o prazo para apresentação da defesa, garantida no artigo 5º, LV, da Constituição Federal. Não obstante, na Justiça do Trabalho, por força dos princípios da economia processual, celeridade, instrumentalidade das formas e simplicidade, o momento para o exercício do direito de defesa é a data da audiência inaugural, independentemente da data da citação (artigo 847 da CLT). Firmou-se nesta Corte o entendimento no sentido de que o aditamento da petição inicial é possível, mesmo após a citação da ré e sem a sua anuência, desde que seja notificada e tenha oportunidade de se manifestar no prazo do artigo 841, caput , da CLT, procedimento observado no caso concreto. Importa ressaltar que o acréscimo feito à petição inicial, desde que assegurado o prazo mínimo de cinco dias para a manifestação do reclamado antes da audiência designada, contribui para a redução do número de ações, na medida em que se evita a formulação da pretensão em outra, posteriormente ajuizada. Ademais, as normas que regem a declaração de nulidade no processo do trabalho vinculam o desfazimento do ato à ocorrência de prejuízo à parte, inocorrente no caso em tela. Assim, a decisão do Tribunal Regional no sentido de ser defeso ao autor modificar o pedido ou a causa de pedir após a citação implica obstar ao recorrente o direito ao devido processo legal, consagrado no artigo 5º, LIV, da Constituição Federal. Recurso de revista conhecido e provido.”(TST – RRAg: 00005972420175090122, relator: Claudio Mascarenhas Brandao, Data de Julgamento: 17/08/2022, 7ª Turma, Data de Publicação: 09/09/2022).

É possível verificar que, a corte superior trabalhista, exige tão somente para que seja feito o aditamento à inicial, mesmo já ocorrendo a citação da reclamada, a aplicação do contraditório e ampla defesa, com concessão de prazo para manifestação da reclamada, com apresentação de outra contestação (artigo 5º, LV CF/88).

É imperioso lembrar que, no direito do trabalho não rara vezes existem uma continuidade da relação laboral, que por seu turno, modifica os fatos até a data da audiência. Ainda assim, o próprio direito do trabalho é balizado nos princípios da informalidade, primazia da realidade, economia e celeridade processual, uma vez que a imposição do artigo 329 do CPC poderá implicar em um outro ajuizamento processual pelo reclamante.

Nesse sentido, respeitado o contraditório e ampla defesa, direitos constitucionais, não há óbice para que até o recebimento da contestação o reclamante venha a propor o aditamento a sua petição inicial, podendo incluir, modificar ou retirar pedido ou causa de pedir.

 

 

Referências bibliográficas:

BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato20152018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 20 jan. 2023.

BRASIL. Lei nº 5.452, de 01 de maio de 1943. Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>

Banco de Jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, disponível em: https://jurisprudencia.tst.jus.br/

NEVES, Daniel Amorim Assumpção, Código de Processo Civil Comentado, 8.ed.rev.atual e ampl. – São Paulo: Editora JusPodivm, 2023

PEREIRA, Leone Pereira, Manual de Processo do Trabalho, 7. Ed. São Paulo, Saraiva Educação, 2020.

DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. Do individual ao coletivo extrapatrimonial. São Paulo: Atlas LTDA., 2017.

Washington Reis é advogado, especialista em Direito Processual Civil, mestrando em Ciências Jurídicas pela Universidade de Lisboa e membro da comissão de contencioso imobiliário da Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário (Ibradim).

Consultor Júridico

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