O Direito Comparado mostra que os países ainda divergem muito quando o assunto é legislação sobre lavagem de dinheiro, apesar dos anos de discurso a favor da uniformização dos mecanismos estatais de repressão a essa prática, afirma o advogado criminalista Juliano Breda.
Uma das principais vozes em defesa da advocacia no debate sobre a revisão da Lei de Lavagem brasileira, Breda analisou o tema em entrevista à série “Grandes Temas, Grandes Nomes do Direito”, na qual revista eletrônica Consultor Jurídico conversa com alguns dos principais nomes do Direito sobre os assuntos mais relevantes da atualidade.
Na visão do criminalista, apesar das cooperações entre os países sugerirem que há um consenso internacional em relação ao crime, na prática o debate sobre lavagem é mais complexo do que se pensa e comporta múltiplas abordagens, funcionando quase como um subsistema no Direito Penal.
Nesse cenário, as grandes discussões passam hoje por um aspecto considerado muito sensível pelos especialistas: os chamados crimes de mero recebimento ou utilização dos valores ilícitos. Segundo Breda, países como a Alemanha e os Estados Unidos punem qualquer hipótese de recebimento e utilização de valores com proveniência ilícita, caso a pessoa envolvida tenha conhecimento dessa situação.
“E isso tanto em relação ao autor do fato principal, naquilo que é chamado de autolavagem, quanto em relação a um terceiro que tenha conhecimento da origem criminosa dos recursos”, completou o advogado.
Já no Brasil a doutrina não admite — e a jurisprudência vai pelo mesmo caminho — a criminalização do mero recebimento ou da utilização de bens, direitos ou valores provenientes de uma infração penal antecedente.
“O entendimento unânime da doutrina mais relevante brasileira, e também dos nossos tribunais, é de que a utilização para efeitos econômicos ou financeiros dos tais bens, direitos ou valores provenientes da infração criminosa não abarcaria as condutas do dia a dia, isto é, as chamadas ações cotidianas de utilização de recursos para pagamento de despesas.”
Isso porque, explicou Breda, tais ações configurariam a mera fruição do proveito do crime, “já desvalorada pelo legislador nas sanções cominadas à infração penal antecedente”.
Abordagens tão distintas mostram que ainda há muita assimetria nos modelos de resposta dos Estados ao fenômeno da lavagem de dinheiro também no que diz respeito à forma de punição da autolavagem — ou seja, a prática de atos de lavagem de dinheiro cometidos pelo próprio autor da infração penal antecedente.
E, nesse aspecto, as abordagens podem ser resumidas em dois tipos. “Na Alemanha e nos Estados Unidos, a punição se dirige, no primeiro momento, à simples utilização e transferência de valores”. No Brasil, ao contrário, o legislador exigirá a prática de ações mais complexas, que coloquem em risco a administração da Justiça, como a ocultação e a dissimulação da origem, do destino ou das características essenciais do produto da infração antecedente, concluiu Breda.
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