As VPNs (redes privadas virtuais), levadas ao centro do debate envolvendo o bloqueio do X no Brasil, têm uso disseminado na China, apesar de alguns obstáculos. O ministro Alexandre de Moraes determinou multa de R$ 50 mil a quem tentar acessar a rede social por meio dessa tecnologia, em uma medida que especialistas consideram de fiscalização impossível.
Na China, em princípio, não há impedimento para usar esse tipo de sistema, que criptografa acessos e muda o registro de localização do usuário, embora não exista regulação clara.
Pouco antes da pandemia, foram impostas limitações, com a derrubada de VPNs locais não autorizadas e a retirada de VPNs internacionais das lojas de aplicativo. Mas seu uso é permitido pelas empresas estatais de telecomunicações.
Registros não oficiais apontam cerca de 30 milhões de usuários na China. As VPNs seriam usadas sobretudo para streaming de vídeo e games. Algumas marcas prometem acesso à Netflix, por exemplo, embora nem sempre entreguem.
As principais, consideradas melhores em algumas listas de internet, seriam Astrill, sediada nas Ilhas Seychelles, ExpressVPN, sediada nas Ilhas Virgens Britânicas, mas baseada em Hong Kong, e NordVPN, sediada na Lituânia.
São também uma maneira de acessar aplicativos populares dos gigantes americanos Meta, como Instagram, e Alphabet, como a busca do Google. Em versão mais controlada, a Microsoft segue na China, sem exigir VPN, com ferramentas como a busca do Bing.
O quadro até aí é mais ou menos estável, em parte porque as plataformas chinesas de tecnologia cresceram além das concorrentes americanas. O atrito maior é em relação ao jornalismo, principalmente de língua inglesa.
Diversos veículos de países emergentes, como esta Folha, são acessíveis sem VPN na China. The New York Times e BBC, não. A disseminação permitida torna o ligar e desligar da ferramenta um incômodo menor, assimilado ao cotidiano.
Um mês e meio atrás, porém, um acontecimento se espalhou como um arrepio por redes sociais como Weibo. Sites e jornais regionais noticiaram a “punição administrativa” de um usuário de Ningde, da província de Fujian, que visitou redes sociais e sites estrangeiros usando “software para contornar o muro” digital que barra o acesso.
Gong, citado apenas pelo sobrenome, foi detido e admitiu, mas não ficou clara qual seria a pena ou se incluiria tempo na prisão. Os primeiros relatos indicavam que estaria sujeito a uma multa de 15 mil yuans (R$ 12 mil).
Jornais chineses registram punições para casos semelhantes no final de 2022, em meio aos protestos contra a política de Covid Zero, mas elas se limitaram a “avisos”. Houve multas maiores que as de Gong, mas para os empreendedores que lançaram VPNs locais sem autorização.
A notícia de Fujian, que foi logo retirada dos sites e jornais do país, segue no ar no Weibo, inclusive foto. Também comentários dizendo que era só pornografia ou que o jornalista Hu Xijin, celebridade e alvo constante na mídia social chinesa, está sempre citando sites estrangeiros e usando o X.
Comentários menos ferinos questionam a decisão por ser algo acontecido há distantes quatro anos, em 2020. Seja como for, o acontecimento e sua publicidade –e permanência dela em rede social– servem para resgatar o temor em torno do uso de VPN na China.
É um ruído que se soma a outro, do usuário constante desse tipo de sistema no país. Por vezes, como nas últimas semanas, o tráfego se torna moroso e irregular. Segundo a GreatFire, organização que monitora a internet chinesa, com financiamento de Washington, nos últimos dois meses Astril, ExpressVPN e outras ficaram mais lentas.