Alan Bousso: A bem-vinda atualização do Código Civil

Instalada em setembro, a comissão de juristas encarregada de rever e modernizar o Código Civil (Lei 10.406, de 2002) tem 180 dias para trabalhar, o que aponta para a apresentação de uma proposta inicial em março de 2024.

A tarefa dos 34 membros da comissão, liderados pelo ministro Luis Felipe Salomão (STJ), não é simples. Afinal, foram múltiplas e intensas as transformações pelas quais a sociedade passou ao longo dos 20 anos que nos separam da última reforma do Código Civil.

Lembremos, em primeiro lugar, das questões que poderiam ter sido melhor resolvidas há duas décadas. Uma das mais relevantes distorções ocorreu no direito sucessório dos companheiros, que acabaram por concorrer com parentes de quarto grau. É algo que sem dúvida pode e deve ser resolvido agora.

No campo imobiliário, a reforma de 2002 deixou passar uma regulação específica e mais detalhada para os condomínios. E sabemos que no Brasil cada vez mais urbano a vida em condomínio é uma tendência crescente. Melhor que regras claras balizem essa convivência.

É evidente que em 2002 vieram também mudanças importantes, a começar pela modernização da linguagem e pela prevalência da perspectiva social em detrimento da individual — diretrizes que a reforma em curso deve manter.

O conceito de família foi ampliado para além do casamento formal, o que enterrou o anacrônico conceito de “filho ilegítimo”.

A adoção do sobrenome do cônjuge passou a ser de mão dupla, assim como a possibilidade de guarda dos filhos, que deixou de ser automaticamente materna.

O comportamento antissocial nos condomínios passou a ser coibido com a previsão de multa.

São avanços que mostram a importância de que o Código Civil seja revisitado de tempos em tempos.

É certo que, banalizada, a  palavra reforma acabou desgastada. Mas essa atualização do Código Civil é assunto de interesse geral. Longe de discussão jurídica teórica, ela aborda aspectos presentes em nossa vida cotidiana. Exemplo disso são as relações baseadas no mundo virtual, que aumentaram exponencialmente nas últimas décadas. Tais relações são o aspecto mais visível do que se espera da reforma atual. Nessa seara, busca-se vencer o desafio de provar a autoria e a territorialidade de atos praticados no ambiente digital para fins de aplicação de leis e de execução das penas.

Aguarda-se ainda a simplificação do divórcio e do fim das uniões estáveis, que, sob o consenso das partes, poderiam ser feitos extrajudicialmente, por escritura pública. Seria momento de incorporar ao código equiparando com a dissolução das uniões estáveis.

Toda a sociedade ganha com essa celeridade.

No campo imobiliário, o Código Civil andará bem ao consolidar o teor do Projeto de Lei 3461/2019, que estabelece personalidade jurídica aos condomínios edifícios, que combinam áreas privativas e compartilhadas.

A possibilidade de acerto nesses e em outros ajustes será maior com participação da sociedade organizada — sobretudo dos operadores do direito — nas três audiências públicas sobre o tema marcadas para 23 de outubro, em São Paulo; para 20 novembro, em local a ser definido, e para 7 de dezembro, em Salvador.

Que a reforma cumpra o papel de atualizar o Código Civil para os tempos que correm, proporcionando a todos a benfazeja segurança jurídica.

Alan Bousso é advogado sócio do escritório Cyrillo e Bousso Advogados e mestre em Direito pela PUC São Paulo.

Consultor Júridico

Facebook
Twitter
LinkedIn
plugins premium WordPress

Entraremos em Contato

Deixe seu seu assunto para explicar melhor