Ana Luísa de Faria: Política de educação digital e homeschooling

A educação digital passou a ter ainda mais relevância no Brasil: o uso das tecnologias digitais na educação, incluindo aulas online, jogos educativos, aplicativos e outras ferramentas digitais que ajudam a melhorar o aprendizado é cada vez mais comum em todo o mundo, principalmente com o crescimento exponencial da tecnologia.

Sem ser possível a presença física de alunos no pico da Covid-19, algumas instituições de ensino mantiveram aulas exclusivamente em modalidade online, para que não houvesse a perda do ano letivo; neste sentido, fomentou-se um debate sobre o homeschooling, uma prática educacional em que os pais ou responsáveis assumem o papel de educadores e ensinam as crianças em casa, em vez de matriculá-las em escolas tradicionais.

Nesse modelo, as famílias escolhem os currículos, materiais e métodos de ensino que consideram mais adequados para as necessidades de aprendizagem de seus filhos. Os defensores do homeschooling apontam vários benefícios, incluindo a flexibilidade de horários, a personalização do aprendizado, a redução de custos, a promoção da convivência familiar e a possibilidade de evitar a exposição a influências negativas ou bullying. Além disso, argumentam que as crianças podem desenvolver habilidades sociais e de interação por meio de atividades em grupos de estudo, aulas de música, artes e esportes, assim como em atividades comunitárias.

No entanto, há também uma série de críticas e preocupações em relação ao homeschooling. Alguns argumentam que as crianças podem perder oportunidades de socialização e interação com outras pessoas de diferentes origens e perspectivas, além de terem dificuldades em lidar com desafios e conflitos típicos do ambiente escolar.

Outros apontam que as famílias que optam pelo homeschooling podem não ter a formação ou habilidades pedagógicas necessárias para fornecer um ensino de qualidade e que o controle governamental sobre a qualidade da educação é perdido.

Também há preocupações com relação à segurança das crianças em casa, especialmente em casos de abuso ou negligência por parte dos pais ou responsáveis. As escolas desempenham um papel importante na detecção e denúncia de casos de abuso sexual e outras formas de violência infantil, e há o risco de que esses casos não sejam relatados ou detectados em casos de homeschooling.

É importante ressaltar que, embora o homeschooling possa ser legal em alguns países, como os Estados Unidos, no Brasil, a prática é ilegal, exceto em casos específicos, como em situações de doença ou deficiência que impeçam o acesso à escola. No Brasil, o homeschooling ainda não é regulamentado por lei. Em 2018, o STF decidiu sob o Recurso Extraordinário 888.815/RS que o ensino domiciliar não é permitido no país até que se tenha lei a edição de uma lei para a sua regulamentação, aprovada no Congresso.

Em Tema 822, de repercussão geral, o STF determinou que “Não existe direito público subjetivo do aluno ou de sua família ao ensino domiciliar, inexistente na legislação brasileira”; porém ressalta-se a questão ainda não foi pacificada.

Há projetos de lei em tramitação no Congresso que buscam regulamentar a modalidade: dentre os projetos, destaca-se o Projeto de Lei 3262/19, de autoria da deputada federal Chris Tonietto (PSL-RJ) e demais deputados, que propõe a regulamentação do homeschooling. O projeto estabelece que as famílias que optarem por essa modalidade de ensino devem ser responsáveis pelo cumprimento dos objetivos de aprendizagem e pela supervisão pedagógica das crianças.

As famílias também deverão apresentar um plano de estudos para ser avaliado pelos órgãos responsáveis pela fiscalização da educação, com o objetivo de assegurar que a formação escolar seja compatível com a idade, série e nível de ensino do estudante.

Quanto ao alinhamento do Poder Executivo, é possível identificar um aumento no debate sobre o tema nos últimos anos, com diferentes posicionamentos políticos e ideológicos. Nesse contexto, o atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, e sua equipe já se posicionaram a defender a revolução tecnológica, a destacar a importância da democratização do acesso à internet para a população brasileira [1]. No entanto, fora alertado para as desigualdades e os desafios do ensino à distância, a criticar a educação 100% digital, sob afirmação de que o homeschooling não é capaz de substituir completamente o ensino presencial [2].

Jessica Lewis/Unsplash

Além das tecnologias digitais, é importante destacar a relevância dos livros didáticos no contexto educacional. Os livros didáticos desempenham um papel fundamental na transmissão de conhecimento, oferecendo um conteúdo estruturado e organizado que auxilia no processo de aprendizagem dos estudantes a partir do fornecimento de informações atualizadas, exercícios práticos, exemplos contextualizados e recursos visuais que contribuem para a compreensão dos temas abordados.

Além disso, os livros didáticos são uma referência constante, permitindo aos alunos revisitar conceitos e consolidar o conhecimento adquirido. Com sua utilização adequada, os livros didáticos podem ser uma ferramenta poderosa para enriquecer o ensino e potencializar o aprendizado dos alunos, complementando as práticas digitais e promovendo uma educação mais completa e abrangente. É fundamental, logo, considerar a importância dos livros didáticos ao no debate de políticas de educação digital e homeschooling.

A política de educação digital no Brasil ainda está em fase de discussão e regulamentação. O homeschooling é um tema polêmico e divide opiniões na sociedade e no Congresso: enquanto alguns partidos e políticos defendem a regulamentação da prática, outros questionam a legalidade e a constitucionalidade do homeschooling e defendem o fortalecimento da educação pública como forma de garantir o direito à educação para todos os cidadãos.

A de Covid-19 acelerou o processo de digitalização da educação em todo o mundo, e o Brasil não foi exceção: o uso de tecnologias digitais na educação se tornou ainda mais relevante, e a política de educação digital ganhou ainda mais destaque no debate público.

Por fim, é importante ressaltar que a política de educação digital no Brasil é um tema complexo e abrangente, que engloba diversos aspectos, como a regulamentação do homeschooling, a qualidade da educação oferecida, o uso de tecnologias digitais em instituições de ensino e a relevância dos livros didáticos. Todos esses elementos devem ser cuidadosamente considerados em discussões abertas e transparentes, que envolvam a participação ativa da sociedade, especialistas em educação e políticos; é por meio dessas discussões que poderão ser tomadas decisões embasadas, visando garantir o acesso universal a uma educação de qualidade para todos os brasileiros.

Portanto, é fundamental valorizar e integrar adequadamente os recursos dos livros didáticos às políticas de educação digital, reconhecendo sua importância como complemento às práticas tecnológicas e promovendo assim uma educação abrangente e de qualidade para todos os brasileiros.

Ana Luísa Oliveira de Faria é advogada especializada em Startups, pós-graduada em Direito Processual Civil, Direito Administrativo, Direito do Estado, Direito Privado pela Universidade Cândido Mendes (Ucam) e em Direito Digital e Compliance e Direito Constitucional pela Faculdade Descomplica.

Consultor Júridico

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