Andréia Pinatti: Reconhecimento dos direitos dos autistas

O processo de reconhecimento dos direitos das pessoas com TEA (Transtorno do Espectro Autista) tem sido lento e custoso. A instituição de uma política nacional de proteção dos direitos, especificamente das pessoas com o Transtorno do Espectro Autista, deu-se no ano de 2012, com o advento da Lei nº 12.764/12, ratificando-se várias garantias fundamentais à classe autista, como o direito a uma vida digna, à integridade física e moral, ao livre desenvolvimento da personalidade, dentre inúmeros outros. Isso porque, com a promulgação da lei, para além da legitimação dessas garantias fundamentais, a par de definições terminológicas, o autista foi equiparado, para fins legais, à pessoa com deficiência, sendo levado a uma condição de detentor de uma gama mais abrangente de direitos.

Em razão dessa ampliação dos benefícios e direitos para as pessoas com autismo ser significativamente recente, muitos não têm conhecimento dos benefícios que lhe são legalmente asseguradas, motivo pelo qual podem estar desapropriando-se (inconscientemente) do que lhes é garantido. É exatamente por isso que o conhecimento dos principais benefícios aos quais a classe dos autistas faz jus é de suma importância e merece ser mais amplamente difundido no seio social.

Neste viés, a título exemplificativo, embora legalmente o autismo seja considerado uma deficiência, para fins de garantia de direitos, não pode, contudo, ser classificado como uma doença preexistente, principalmente para impor limitações ou para alargar o tempo de carência na contratação de planos de saúde. Na verdade, além de não poder limitar benefícios, os planos devem seguir as diretrizes impostas pela ANS, que expandiram as vantagens, por meio de determinações que proibiram a limitação de quantidade preestabelecida de terapias com psicólogos e fonoaudiólogos. No entanto, muitos autistas, ainda hoje, consentem com uma ampliação de carência na contratação do plano de saúde por terem sua condição equiparada à doença preexistente e desconhecerem o direito que lhes ampara.

Debater sobre os direitos garantidos às pessoas com TEA é, acima de tudo, necessidade social. Por isso, apontar-se-á, a partir de agora, alguns dos benefícios direcionados à classe autista no que se refere à educação, ao auxílio federal, à isenção fiscal e ao transporte.

No âmbito educacional, é assegurado à criança ou adolescente com autismo o direito a um professor de apoio, sempre que comprovada a necessidade, sem que isso lhe gere um custo adicional na matrícula ou na mensalidade. Isso quer dizer que todo aluno autista que demonstrar a indispensabilidade de ter um acompanhamento especializado terá assegurada, nos moldes estabelecidos pela Lei nº 9.394/1996 (artigo 59, III), a presença de um profissional especializado que o acompanhe nas salas de aula regulares, independentemente de o estabelecimento de ensino ser público ou privado.

Ademais, a Lei nº 8.742/1993 assegurou à pessoa com deficiência (e após 2012, aos autistas também) o direito ao benefício do BPC/Loas, que consiste no recebimento do valor de um salário mínimo mensal para autistas que, segundo a lei, estiverem inseridos em famílias cuja renda per capita seja de ¼ de salário mínimo.

Muito embora a lei preveja esse limitador de valor de renda familiar, a jurisprudência já tem se posicionado em sentido diverso, desde que o propenso beneficiário comprove sua hipossuficiência financeira. Nesse sentido, inclusive, o STJ [1] sedimentou referido entendimento, ao afirmar que o critério objetivo de renda mensal legalmente imposto pode ser relativizado, podendo ser aplicados outros fundamentos para aferição de condição de miserabilidade da pessoa com deficiência, sendo tal posicionamento objeto do Tema Repetitivo 185/STJ.

Na mesma linha, o STF [2] ratificou o entendimento de que o quantum estabelecido pela lei deve ser apenas um dos norteadores da decisão do juiz, o qual deverá ponderar outros elementos comprobatórios da necessidade/miserabilidade da família, até porque os critérios de limitação do valor previstos legalmente sequer se coadunam com o ordenamento vigente, em face das mudanças socioeconômicas pelas quais o país atravessa.

Além do benefício assistencial BPC/Loas, as pessoas autistas têm direito à isenção do IPVA, respeitados os critérios estabelecidos por cada estado. A título de exemplo, no Paraná, o privilégio é direcionado a todo autista que possuir veículos com motorização inferior a 155 cv.

Há, ainda, a previsão de descontos em passagens aéreas [3] e de ônibus [4], prioridade em atendimentos em serviços públicos e privados [5] , redução de carga horária de trabalho para funcionários públicos, pais de autistas [6], bem como direito a vagas preferenciais em empregos.

No contexto ora apresentado, verifica-se um ligeiro avanço legislativo concernente à tutela dos direitos das pessoas que possuem o Transtorno do Espectro Autista, sobretudo considerando o advento da Lei nº 12.764/12, assegurando a elas inúmeros direitos fundamentais e garantias essenciais. Não se pode olvidar, todavia, que ainda há muito a se fazer, essencialmente no que diz respeito à adequada exposição da informação sobre a existência dos benefícios conferidos aos autistas e a implementação de iniciativas que busquem assegurar a efetividade destes direitos.

Assim, tendo em mente que é necessária a maior propagação da informação no que tange à existência de direitos da pessoa com TEA, bem como que a equiparação da classe autista a pessoas com deficiência (para fins estritamente legais) visa a garantir dignidade e adequado exercício da cidadania, é papel de toda a sociedade lutar pela efetivação de tais direitos e pela igualdade de todos, consoante imposto pela Constituição, em seu artigo 5º caput.

Andréia Pinatti de Oliveira é advogada, pós-graduanda em Direito de Família e Sucessões, pós-graduada em Direito Processual Civil pela Faculdade Damásio, bacharel em Direito pela Unicesumar e licenciada em Letras Português/Inglês pela Universidade Estadual de Maringá.

Consultor Júridico

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