Atuação como AGU não impede Mendonça de julgar marco temporal

Nos Recursos Extraordinários com repercussão geral reconhecida, o impedimento do ministro do Supremo Tribunal Federal se restringe à etapa da votação referente ao caso concreto — ou seja, não se aplica à votação da tese constitucional (o que inclui os debates e as sessões correspondentes), pois nesta fase não se discutem situações ou interesses individuais.

André Mendonça participou do processo como AGU antes de chegar ao STFCarlos Moura/SCO/STF

Esse foi o entendimento do Plenário do STF ao validar a participação do ministro André Mendonça no julgamento sobre o marco temporal para a demarcação de terras indígenas. O magistrado já atuou no caso como advogado-geral da União (cargo que ocupava antes de sua indicação à Corte). A sessão virtual de análise da questão de ordem se encerrou nesta segunda-feira (14/5).

Quando chefiava a AGU, Mendonça chegou a pedir que a União fosse reconhecida como parte no processo e apresentou manifestação quanto a um pedido da Defensoria Pública da União para suspender um parecer da sua pasta relativo à demarcação de terras indígenas.

O julgamento principal, que ocorre em sessões presenciais, está suspenso desde o último mês de junho, por pedido de vista do próprio Mendonça. Ele mesmo levantou a questão de ordem sobre sua eventual suspeição no RE.

Fundamentação

O voto de Mendonça foi acompanhado por todos os demais ministros. Ele apontou que o STF, quando aprecia um RE com repercussão geral, está, no fundo, julgando uma tese. Além disso, a eventual perda de objeto do caso concreto do recurso não impede o julgamento do tema em abstrato.

O magistrado aplicou a mesma lógica para sua situação: “Não vislumbro qualquer razoabilidade ou lógica jurídica em afastar a participação de um membro deste colegiado com base em suposta quebra de imparcialidade relacionada a um caso concreto, sobre o qual recairá a força do precedente firmado”.

Mendonça ainda ressaltou que o tribunal somente delibera a tese após o fim do julgamento do processo paradigma. Ou seja, toda a discussão sobre “contornos, nuances e abrangência da tese” ocorre simultaneamente à apreciação do caso concreto.

“Na maioria das vezes, são tantas e tão mais complexas as variáveis atinentes à matéria, em contraposição aos limites do caso individual afetado, que as discussões realmente a ele não se atêm, ainda que marginalmente”, assinalou.

Por fim, o ministro lembrou que, em outras ocasiões, o STF já aplicou o mesmo entendimento para afastar o impedimento ou a suspeição em ações de controle concentrado de constitucionalidade (como Ações Diretas de Inconstitucionalidade e Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental).

Marco temporal

O RE em questão discute se a data de promulgação da Constituição, em 1988, deve ser adotada como marco temporal para definição da ocupação tradicional de terras por indígenas.

Antes do pedido de vista de Mendonça, os ministros Luiz Edson Fachin e Alexandre de Moraes votaram contra tal marco temporal, em respeito à tradição das terras indígenas. Já o ministro Kassio Nunes Marques divergiu, por considerar que a definição aumenta a segurança jurídica.

O caso concreta trata da disputa pela posse da Terra Indígena Ibirama-Laklãnõ, em Santa Catarina, onde vivem povos Xokleng, Guarani e Kaingang. O governo catarinense pede a reintegração de posse, com base na tese do marco temporal.

No último mês de maio, a Câmara aprovou um projeto que reconhece a data de promulgação da Constituição como marco temporal para demarcação de terras indígenas. O texto ainda precisa ser votado pelo Senado.

Clique aqui para ler o voto de Mendonça

RE 1.017.365

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