Como convidado de uma empresa de hardware que presta serviços para a NFL, assisti na sexta-feira (6) no estádio do Corinthians a Philadelphia Eagles 34 x 29 Green Bay Packers, o primeiro jogo no Brasil da liga de futebol americano dos EUA.
A Zebra Technologies, sediada no estado de Illinois, é contratada da NFL para operar o RFID (Radio Frequency Identification), método de identificação por radiofrequência.
É uma tecnologia muito usada em logística que emprega ondas de rádio para localizar e rastrear, por exemplo, objetos e pessoas.
Jogadores de todos os 32 times da liga são monitorados em cada partida. Para isso, é necessária a instalação de antenas nas arenas. Elas têm formato retangular e medem, aproximadamente, 10 cm x 5 cm x 3 cm (comprimento, largura e altura).
Em Itaquera, na zona lesta paulistana, foram 22 as unidades fixadas no estádio, em volta do gramado, 8 em cada lateral, na estrutura que suporta o público, e 3 atrás de cada um dos Y, na região dos placares eletrônicos.
Elas são parte de um sistema que atua conjuntamente com pequenos dispositivos (sensores) que ficam no uniforme dos jogadores. São dois, fixados nas ombreiras de cada atleta e, de acordo com a Zebra, imunes a pancadas ou quedas dos mesmos durante o jogo.
Esquema montado, a prática permite o monitoramento, em tempo real, de cada movimento executado pelos jogadores.
Tecnologia que se transforma em estatísticas (Next Gen Stats), que abastecem os treinadores das equipes e, caso a NFL libere os dados, as TVs que exibem os confrontos.
São dezenas de dados, que incluem ações do atleta sem a bola (movimentação, posição no campo) e com ela (velocidade, jardas acumuladas), além de fornecer a probabilidade de êxito em determinada jogada.
Para quem “se alimenta” de números, um prato cheio e saboroso –norte-americanos, em especial, adoram.
Na partida de estreia na NFL, soube-se que o recebedor A.J. Brown, dos Eagles, atingiu a maior velocidade com a bola (perto de 34 km/h) e que o corredor Josh Jacobs, dos Packers, conseguiu em suas 16 tentativas de avanço 2,37 jardas a mais que o esperado em cada uma.
São informações que têm utilidade para as equipes em suas estratégias de jogo. Aliás, o próprio jogador as acessa, se quiser, e pode fazer uma autonálise (“estou melhor ou pior do que antes”).
Porém, para quem não é muito afeito aos números, o interesse pode não ser alto.
No futebol americano, para nós, brasileiros, a prioridade não são as estatísticas, e sim entender as regras e a dinâmica do esporte e ver muitos touchdows (a jogada máxima, o “gol” na NFL).
Assim, há uma primeira questão a ser feita: essa tecnologia é adaptável ao nosso futebol –chamado nos EUA de soccer–, que nunca passou por essa experiência?
De acordo com Derek Bonuccelli, gerente sênior de produtos esportivos da Zebra, sim. Mas, para isso, é necessário que o organizador do campeonato se acerte com os times participantes, pois o estádio de cada um precisa receber o equipamento (antenas) que viabilize as operações.
Parece não ser um problema. Se é algo que pode ajudar a melhorar a performance por meio de observação mais precisa e detalhada do pé de obra, as equipes não oferecerão resistência.
O que pode influenciar é o valor. Perguntei a Bonuccelli o quanto custaria para usar o sistema no Campeonato Brasileiro. Ele disse ser necessário o cliente, nesse caso a CBF (Confederação Brasileira de Futebol), formalizar o interesse para que uma proposta possa ser elaborada.
O executivo não divulgou quanto a NFL, única liga a ter esse serviço, paga anualmente –o atual contrato vai até 2025. Ou seja, não se sabe quão caro o sistema é.
Uma segunda questão a ser feita: o futebol precisa dessa ferramenta? Fiquei imaginando a utilidade que ela pode ter.
Considerando-se sempre o advento do “tempo real”, faz diferença, por exemplo, saber quantas vezes determinado jogador do setor de criação está tocando na bola, a fim de medir se está sendo mais ou menos participativo que o esperado?
Pode ser que sim.
Com informação como essa, o técnico pode tomar uma decisão rápida e passar uma orientação, com a partida em andamento, para que o atleta atue de outra forma (mais avançado, mais recuado, mais pelas laterais, mais pelo meio), a fim de tentar otimizar rapidamente seu desempenho. Ou então decidir por substituí-lo.
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A análise de dados é crescente no esporte em geral, tanto que quem acompanha o futebol sabe que faz anos jogadores de vários times usam por baixo da camisa uma espécie de colete (chamado popularmente de “top” ou “sutiã”) com tecnologia GPS.
Esse dispositivo serve para monitorar o desempenho físico dos atletas, rastreando sua posição, a distância percorrida, a velocidade e a aceleração empreendidas.
Em síntese, é relevante saber que existe uma tecnologia de ponta que pode oferecer, prontamente, dezenas de dados individuais dos jogadores e que funciona com sucesso em uma das mais famosas ligas esportivas do planeta.
Considero, contudo, que não será algo utilizado de forma pioneira no Campeonato Brasileiro –menos que por possível falta de condição financeira, mais por mero desinteresse.
A CBF despreza por completo as estatísticas, tanto que no site do Brasileiro inexiste uma seção dedicada a elas. Não há sequer uma lista dos artilheiros, que é a informação numérica mais elementar desejada por quem acompanha a competição.
E, se não há nem o básico do básico, o avançad(íssim)o ficará restrito ao campo das ideias.