A garantia de autenticidade de documentos é de fundamental relevância no curso de um procedimento licitatório, possuindo um sentido dúplice: a) afiança que o licitante está agindo de boa-fé, apresentando comprovantes idôneos à execução de um contrato administrativo, especialmente sob o ponto de vista das qualificações jurídicas, econômico-financeiras e técnicas; e, b) garante à administração pública que o contratado tem condições de executar suas obrigações contratuais e exigir do Poder Público seus direitos.
O caminho adotado pela prática da Lei de Licitações e Contratos Administrativos anterior (Lei nº 8.666/1993) foi de exigência, em sede de edital, do reconhecimento de autenticidade nos documentos apresentados pelo licitante. A ideia era, primordialmente, de preservação da integridade e confiabilidade da documentação submetida pelos licitantes.
No entanto, o aprendizado da Lei nº 8.666/1993 demonstrou que a exigência constituiu uma verdadeira barreira à participação de interessados em licitações que, muitas vezes, eram inabilitados dos procedimentos licitatórios por não terem apresentado uma página apenas sem cópia autenticada. Na clássica lição de Adilson de Abreu Dallari, “a licitação não é um concurso de destreza, destinado a selecionar o melhor cumpridor de edital” [1].
Para enfrentar essa problemática, tanto a doutrina quanto a jurisprudência desenvolveram o conceito do formalismo moderado como uma abordagem para lidar com esses excessos formais.
Porém, exageros também foram cometidos sob a utilização do referido princípio, como a flexibilização acolhida pelo TCU de que é possível a complementação da documentação de habilitação [2].
Foi nesse contexto que, no ano de 2018, foi editada a Lei nº 13.726/2018, que previu a impossibilidade de a administração pública exigir a autenticação de documentos em cartório, devendo o agente público comparar a assinatura ou com o original para que possa aferir a autenticidade da documentação.
Até o ponto que se chegou à previsão da Nova Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021), que traz interessante mecanismo que possibilita a autenticação de documentos por advogado, ao prever no artigo12, VI, que a “a prova de autenticidade de cópia de documento público ou particular poderá ser feita perante agente da Administração, mediante apresentação de original ou de declaração de autenticidade por advogado, sob sua responsabilidade pessoal”.
A previsão normativa atribui uma nova responsabilidade à advocacia, que agora desempenhará um papel fundamental na garantia da integridade da documentação apresentada pelos licitantes. Os advogados são os profissionais mais indicados para assegurar a correta apresentação dos documentos à administração pública.
Por essa razão, a advocacia desempenhará um papel de destaque nesse processo de transformação dos procedimentos licitatórios, uma vez que a própria lei confere fé-pública às declarações prestadas por esses profissionais.
Função de prestígio, garantida por lei, que carrega consigo a responsabilidade inerente ao seu exercício. O advogado deverá aferir com cuidado a lisura da documentação, exercendo, se for o caso, o controle preliminar de atendimento do licitante às exigências editalícias, afinal, é o primeiro “juiz” da viabilidade de qualquer causa submetida ao seu patrocínio [3]. Não deverá incentivar o desatendimento dos requisitos editalícios pelo licitante, uma vez que isso compromete a credibilidade da fé pública legal do advogado.
A Lei nº 14.133/2021 reflete a busca de um equilíbrio entre a necessidade de se assegurar a autenticidade de documentos e a facilitação de acesso aos procedimentos licitatórios.
A Nova Lei de Licitações, ao possibilitar aos advogados a responsabilidade de atestar a autenticidade documental, não apenas simplifica procedimentos, mas também destaca a relevância desses profissionais como guardiões da integridade e legalidade nas contratações públicas, ressaltando o papel dos advogados na busca de um processo licitatório transparente e mais eficiente.
Clóvis Alberto Bertolini de Pinho é mestrando em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo (USP) e advogado sócio do Vernalha Guimarães &Pereira, em Curitiba, atuando na área de Direito Administrativo e Infraestrutura.