O Conselho Nacional do Ministério Público publicou, na quinta-feira (10/8), a Recomendação 102/2023, que propõe o aprimoramento da atuação dos órgãos ministeriais nos casos de recuperação judicial e falência de empresas.
A proposta, apresentada pelo presidente da Unidade Nacional de Capacitação do Ministério Público, conselheiro Daniel Carnio, e relatada pelo então conselheiro Jaime de Cassio Miranda, foi aprovada, por unanimidade, na 1ª Sessão Extraordinária de 2023, em 3 de julho.
O objetivo da recomendação é orientar e aperfeiçoar a atuação do Ministério Público no emprego da Lei de Recuperação Judicial e Falências de empresas e em situações correlatas e assemelhadas, visando a salvaguardar o interesse público que decorre da necessidade de aplicar eficazmente as ferramentas legais do sistema de insolvência empresarial, a fim de evitar ou reduzir e minimizar os prejuízos sociais que dela possam advir.
A atuação do MP na temática terá por parâmetros o equilíbrio entre as noções de encerramento de atividades econômicas viáveis e a manutenção artificial do funcionamento de empresas inviáveis; o risco da perda dos potenciais empregos, tributos e riquezas, que impedem a produção de benefícios econômicos e sociais, e que atua em prejuízo do interesse da sociedade e do adequado funcionamento da economia; e a defesa dos direitos sociais decorrentes de eventuais prejuízos ameaçados ou causados pela insolvência empresarial.
Entre outros dispositivos, a recomendação sugere que a Unidade Nacional de Capacitação do CNMP, a Escola Superior do MPU e os Centros de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional promovam a capacitação contínua dos membros, servidores e colaboradores, por meio de cursos, seminários, eventos, palestras e assemelhados, visando orientar e aperfeiçoar a atuação do Ministério Público.
Além disso, sem prejuízo da autonomia institucional, cada ramo e unidade do MP adaptará e aprimorará sua disciplina normativa e de natureza administrativa para garantir estrutura adequada e especializada visando atender aos objetivos da recomendação. Por fim, é recomendável a criação, conforme deliberação administrativa superior de cada unidade, de promotorias especializadas em recuperação judicial e falência de empresas.
Repercussão
Pedro Almeida, especialista em insolvência e contencioso empresarial do GVM Advogados, avalia que as hipóteses descritas na Recomendação “são meramente exemplificativas, o que gera dúvidas quanto à pertinência da intervenção do MP em algumas fases e incidentes do processo”. “A Recomendação do CNMP complementa a legislação vigente, ao sugerir novas hipóteses de intervenção do MP, que não estão previstas em lei. Na prática, porém, a maior parte das sugestões já é observada pelos promotores atuantes nas varas de falências. Portanto, a Recomendação terá pouca repercussão sobre os processos em curso”, opina.
Gabriel Montemezzo, advogado da área de contencioso Cível e empresarial do Costa Tavares Paes Advogados, lembra que o MP já atua, ainda que não haja obrigatoriedade, nas ações de recuperação judicial, e, de forma obrigatória, nos processos falimentares. “Não obstante, o MP também tem atribuição nas investigações de crimes falimentares (arts. 168 a 178 da Lei 11.101/05), além de atuar como verdadeiro fiscal da lei em inúmeros momentos dos processos de recuperação judicial e falência. Diante desse protagonismo, a experiência nas ações falimentares e de recuperações judiciais demonstra o quão imprescindível é a atuação do MP nesse tipo de procedimento, pois, na ausência de sua atuação, estaríamos diante de um grande prejuízo aos interesses públicos, seja de caráter social ou econômico”, comenta.
Ainda segundo Montemezzo, a Recomendação do CNMP “é extremamente exultante, na medida em que aperfeiçoará ainda mais a atuação do órgão ministerial, a fim de proteger a lisura dos procedimentos falimentares e de recuperações judiciais”.
Já para Bianca Bez, advogada da área de Contencioso e Arbitragem com ênfase em Energia do BBL Advogados, a Recomendação destaca uma possível atuação do MP que, antes, não era considerada, “uma ação foco dos promotores de justiça, apenas nos casos em que eram obrigados a se manifestar”. “Com essa Recomendação, na prática, pode ser que os procedimentos de recuperação judicial e falência passem a ser olhados mais de perto pelo MP. Sopesando pontos negativos e positivos, a norma enquadra uma atuação que pode beneficiar o regular andamento dos feitos, mas, por outro lado, poderá ter o condão de alongar o tempo de sua duração”, comenta.
A advogada destaca como principais trechos da norma, sob a perspectiva da recuperação judicial: o equilíbrio entre encerramento de atividades econômicas viáveis e a manutenção artificial de empresas inviáveis; a prevenção da perda de empregos, tributos e riquezas que prejudicam a sociedade e a economia; a defesa dos direitos sociais resultantes de prejuízos pela insolvência; a intervenção facultativa do MP em procedimentos de recuperação judicial antes do deferimento; a cooperação do MP com agências reguladoras em liquidações extrajudiciais, dentre outros pontos.
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