Depois de quase 30 anos de inúmeras discussões, o projeto de reforma tributária foi finalmente aprovado na Câmara dos Deputados e segue para discussão e votação no Senado. Muito tem se discutido sobre os efeitos nos diversos setores econômicos — notadamente o de prestação de serviços —, mas nos chama a atenção a escassez de debates com relação às startups de rápido crescimento.
Talvez o grande motivo do pouco debate seja o fato de grande parte das startups estarem enquadradas no chamado Simples Nacional. Em resumo, esse regime é um benefício fiscal onde as empresas com faturamento anual de até R$ 4,8 milhões são tributadas a uma alíquota fixa. A reforma tributária manteve intacto este benefício.
É natural de se esperar — como em qualquer outro ramo de negócio — um crescimento rápido de receita dessas empresas, sendo que o próximo passo seria a saída do Simples Nacional e a adoção do Lucro Presumido.
No Lucro Presumido as empresas do setor de serviços pagam uma alíquota efetiva média entre 16,53% e 19,53%, dependendo do município em que estão estabelecidas (ISS entre 2% e 5%, PIS/Cofins 3,65%, IRPJ/CSLL 10,88%). Neste regime os insumos utilizados na prestação de serviços não dão direito a creditamento para fins de PIS/Cofins.
Com a entrada em vigor da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), a tributação deixará de incidir diretamente sobre as receitas (“tributação em cascata”) e passará a incidir sobre o “valor adicionado” na prestação do serviço, vale dizer, os insumos passarão a gerar direito a creditamento desde que tenham sido tributados na etapa anterior.
A grande questão é que, na maioria dos casos, o “insumo” mais relevante nestas empresas é o capital humano que se materializa no custo com a folha de pagamentos. É sabido que salários não serão tributados pela CBS, ou seja, não darão direito a créditos.
Neste cenário é bem provável que os prestadores de serviços, independentemente da alíquota a ser praticada pela CBS (que aliás, ainda não se sabe e somente será estabelecida por lei complementar), terão sua carga tributária aumentada uma vez que o principal “insumo” não gerará direito à creditamento.
Este cenário precisa ser bem analisado pelo legislador, uma vez que consequências econômicas deletérias podem se materializar como, por exemplo, um aumento indesejado no nível de preços, “pejotização” da mão de obra e “fracionamento” de negócios em diferentes empresas.
A simplificação do regime tributário com a uniformização de tributos e alíquotas não deve ser motivação para aumento efetivo de carga tributária de setores tão importantes para o dinamismo da economia brasileira. Neste sentido, a desoneração da folha de pagamentos pode vir a desempenhar o papel de “fiel da balança”, neutralizando, mesmo que em parte, o aumento na carga tributária.
A reforma tributária é vital para a melhora do ambiente de negócios no país e carece de discussões e análises mais profundas, sob o risco de impactar negativamente um conjunto de empresas tão importantes no processo de dinamização tecnológica da economia.
Fernando Moura é mestre e doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP), master of laws (LL.M.) pela New York University (NYU) e professor da Faculdade de Direito Milton Campos (FDMC).