Guilherme Eliano: Litigância predatória e cortina de fumaça

O termo é novidade, mas a intenção é antiga. Registros históricos dão conta que Dario 3, rei da Pérsia, ao ouvir do mensageiro que seu exército havia perdido a guerra para Alexandre, o Grande, ordenou a execução desse, talvez para encobrir o fracasso das suas forças militares. A falta de êxito em atingir um objetivo a contento não deve ser encoberta calando aquele que a anuncia.

Com a necessidade de dar freio à grande quantidade de pessoas que procuram o poder judiciário para a solução de seus problemas, surgiu o termo litigância predatória, com finalidade de atingir os advogados especializados em demanda em massa, que trabalham em escala, com muitos processos e muitos clientes.

Eis o início da discussão do Tema 1.198 dos recursos repetitivos do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o marco de uma pressão do judiciário contra os advogados e os processos massificados.

Então, qual o porquê da cortina de fumaça? A resposta está no porquê dos processos em excesso.

As empresas fornecedoras e prestadoras de serviços têm para si somente um foco: o lucro como fim. A preocupação primordial é de realizar vendas e obter receita com o menor custo possível e com isso vai a reboque o pós venda.

Pós venda no sentido das empresas fornecedoras e prestadoras de serviços terem a preocupação e percepção de que a resolução de grande parte dos problemas que as empresas venham a identificar no relacionamento com os clientes poderiam ser resolvidos junto aos consumidores diretamente, o que não é feito. Exemplificando: ao escolher uma companhia aérea e comprar uma passagem de avião, há uma sensação de insegurança que naquele dia e hora a viagem não seja cumprida com pontualidade, cujo maior temor é que a viagem não ocorra.

A cada voo cancelado, imaginamos: qual momento em que a empresa teve acesso a informação do cancelamento do voo? Não teriam tempo hábil de entrar em contato com os clientes em qualquer formato (e-mail, ligação, aplicativos de mensagens) para resolução do problema? Sabemos apenas que as pessoas são surpreendidas, até mesmo após o check-in, com a informação de que o voo foi cancelado. Os passageiros perderam tempo, dinheiro, compromissos ou até dias das contadas férias.

Essa preocupação com pós vendas só existe quando há uma enxurrada de ações contra fornecedoras e prestadoras de serviços. Com péssima qualidade de serviços prestados e a inexistência de tratativa administrativa para resoluções de problemas, os consumidores estão procurando seus direitos e ingressando com ação judicial. E qual a providência das empresas? Melhorar a jornada do cliente, qualificando a experiência desse com o serviço prestado? Não. Mas sim atacar o advogado, o mensageiro.

É de uma clareza cristalina que a melhor tática é atacar o mensageiro, a ponte que conecta o cidadão ao judiciário, o advogado, este que de fato dá o acesso à justiça. Dinamitando as pontes, ninguém passa por cima delas, nem sequer embaixo, simplesmente não tem mais trânsito.

Eis a verdadeira intenção dos criadores da expressão “litigância predatória”: realizar uma redução drástica na quantidade de processos impossibilitando que os advogados ingressem com demandas judiciais justas e asseguradoras do bom direito. Geniais!

No caso em tela, no Tema 1198 dos recursos repetitivos do STJ iniciou-se com um determinado advogado que ingressou com um número elevado de processos judiciais contra bancos, em especial, questionando contratos bancários de empréstimo consignado.

A grande reclamação dos consumidores é que foram contratados empréstimos sem as suas anuências, sem nem sequer terem recebido o dinheiro do empréstimo consignado contratado.

Com isso, há uma grande quantidade de empréstimos consignados realizados (ou não) pelos aposentados, pensionistas e servidores públicos. E quando estes verificam fraudes, buscam a resolução de seu problema. Em certas ocasiões buscam administrativamente junto aos Decons e Procons, que convidam as empresas à audiência de conciliação e na ocasião de comparecimento (há muitas faltas), em grande maioria não alcançam a solução da demanda.

Sem solução, o que também passa pela inércia das agências reguladoras, os consumidores colocam esperança em advogados com a demanda judicial. Note que a busca de advogados se dá pela ineficácia de resolução administrativa tanto da empresa quanto dos órgãos de defesa do consumidor. O que salta aos olhos é a incapacidade de resolução das empresas para com as demandas de seus clientes, tendo esses, após terem suas queixas desprezadas massivamente, que buscar a alternativa judicial.

Com o tempo, é natural a baixa procura. Não ir aos Procons e Decons por não resolver o problema. Não buscar as empresas por não resolver os problemas. Por enquanto, buscam os advogados, que resolvem os problemas… por enquanto! Se dependermos da força do lobby de inventores do termo “litigância predatória”, essa resolução irá acabar.

E o problema do consumidor? Este não importa. Consumidor, para as empresas, é apenas para consumir, gastar e entregar o dinheiro somente, movimentando a lucrativa engrenagem.

Buscando o resgate do direito de advogar ao advogado, em prol do benefício da parte vulnerável e muitas vezes hipossuficiente frente a demanda irresolvida pelo prestador ou fornecedor de serviço contratado ou pseudocontratado, almeja-se aqui ser o vento que dissipará a fumaça e permitirá que os raios solares mostrem a verdade sobre os fatos e as devidas responsabilidades. Resta-nos dizer: “ne nuntium necare”.


Consultor Júridico

O termo é novidade, mas a intenção é antiga. Registros históricos dão conta que Dario 3, rei da Pérsia, ao ouvir do mensageiro que seu exército havia perdido a guerra para Alexandre, o Grande, ordenou a execução desse, talvez para encobrir o fracasso das suas forças militares. A falta de êxito em atingir um objetivo a contento não deve ser encoberta calando aquele que a anuncia.

Com a necessidade de dar freio à grande quantidade de pessoas que procuram o poder judiciário para a solução de seus problemas, surgiu o termo litigância predatória, com finalidade de atingir os advogados especializados em demanda em massa, que trabalham em escala, com muitos processos e muitos clientes.

Eis o início da discussão do Tema 1.198 dos recursos repetitivos do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o marco de uma pressão do judiciário contra os advogados e os processos massificados.

Então, qual o porquê da cortina de fumaça? A resposta está no porquê dos processos em excesso.

As empresas fornecedoras e prestadoras de serviços têm para si somente um foco: o lucro como fim. A preocupação primordial é de realizar vendas e obter receita com o menor custo possível e com isso vai a reboque o pós venda.

Pós venda no sentido das empresas fornecedoras e prestadoras de serviços terem a preocupação e percepção de que a resolução de grande parte dos problemas que as empresas venham a identificar no relacionamento com os clientes poderiam ser resolvidos junto aos consumidores diretamente, o que não é feito. Exemplificando: ao escolher uma companhia aérea e comprar uma passagem de avião, há uma sensação de insegurança que naquele dia e hora a viagem não seja cumprida com pontualidade, cujo maior temor é que a viagem não ocorra.

A cada voo cancelado, imaginamos: qual momento em que a empresa teve acesso a informação do cancelamento do voo? Não teriam tempo hábil de entrar em contato com os clientes em qualquer formato (e-mail, ligação, aplicativos de mensagens) para resolução do problema? Sabemos apenas que as pessoas são surpreendidas, até mesmo após o check-in, com a informação de que o voo foi cancelado. Os passageiros perderam tempo, dinheiro, compromissos ou até dias das contadas férias.

Essa preocupação com pós vendas só existe quando há uma enxurrada de ações contra fornecedoras e prestadoras de serviços. Com péssima qualidade de serviços prestados e a inexistência de tratativa administrativa para resoluções de problemas, os consumidores estão procurando seus direitos e ingressando com ação judicial. E qual a providência das empresas? Melhorar a jornada do cliente, qualificando a experiência desse com o serviço prestado? Não. Mas sim atacar o advogado, o mensageiro.

É de uma clareza cristalina que a melhor tática é atacar o mensageiro, a ponte que conecta o cidadão ao judiciário, o advogado, este que de fato dá o acesso à justiça. Dinamitando as pontes, ninguém passa por cima delas, nem sequer embaixo, simplesmente não tem mais trânsito.

Eis a verdadeira intenção dos criadores da expressão “litigância predatória”: realizar uma redução drástica na quantidade de processos impossibilitando que os advogados ingressem com demandas judiciais justas e asseguradoras do bom direito. Geniais!

No caso em tela, no Tema 1198 dos recursos repetitivos do STJ iniciou-se com um determinado advogado que ingressou com um número elevado de processos judiciais contra bancos, em especial, questionando contratos bancários de empréstimo consignado.

A grande reclamação dos consumidores é que foram contratados empréstimos sem as suas anuências, sem nem sequer terem recebido o dinheiro do empréstimo consignado contratado.

Com isso, há uma grande quantidade de empréstimos consignados realizados (ou não) pelos aposentados, pensionistas e servidores públicos. E quando estes verificam fraudes, buscam a resolução de seu problema. Em certas ocasiões buscam administrativamente junto aos Decons e Procons, que convidam as empresas à audiência de conciliação e na ocasião de comparecimento (há muitas faltas), em grande maioria não alcançam a solução da demanda.

Sem solução, o que também passa pela inércia das agências reguladoras, os consumidores colocam esperança em advogados com a demanda judicial. Note que a busca de advogados se dá pela ineficácia de resolução administrativa tanto da empresa quanto dos órgãos de defesa do consumidor. O que salta aos olhos é a incapacidade de resolução das empresas para com as demandas de seus clientes, tendo esses, após terem suas queixas desprezadas massivamente, que buscar a alternativa judicial.

Com o tempo, é natural a baixa procura. Não ir aos Procons e Decons por não resolver o problema. Não buscar as empresas por não resolver os problemas. Por enquanto, buscam os advogados, que resolvem os problemas… por enquanto! Se dependermos da força do lobby de inventores do termo “litigância predatória”, essa resolução irá acabar.

E o problema do consumidor? Este não importa. Consumidor, para as empresas, é apenas para consumir, gastar e entregar o dinheiro somente, movimentando a lucrativa engrenagem.

Buscando o resgate do direito de advogar ao advogado, em prol do benefício da parte vulnerável e muitas vezes hipossuficiente frente a demanda irresolvida pelo prestador ou fornecedor de serviço contratado ou pseudocontratado, almeja-se aqui ser o vento que dissipará a fumaça e permitirá que os raios solares mostrem a verdade sobre os fatos e as devidas responsabilidades. Resta-nos dizer: “ne nuntium necare”.


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