Henrique Quaresma: Princípio da legalidade imposto pelo art. 37

É de conhecimento de todos que, consoante previsto pelo artigo 5º, inciso II, da Constituição [1], “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Ou seja, o particular pode fazer tudo o que a lei expressamente não proíba, contudo, para o administrador público, este somente pode fazer o que a lei expressamente permita, traduzindo-se no cumprimento do princípio da legalidade imposto pelo artigo 37 da Carta Magna [2].

É por essa razão que os entes de toda a Administração Pública, ao deflagrarem certames licitatórios cujo objeto seja a contratação de empresa para a prestação de serviços de plano de saúde ou odontológicos, não podem impor previsões para a execução do contrato administrativo diversas daquelas estipuladas pela Agência Nacional de Saúde Suplementar. Afinal, o artigo 4º da Lei 9.961/2000 muito bem estabelece a competência exclusiva da ANS para a regulação do setor de saúde suplementar.

Ou seja, mesmo que um administrador público seja competente para deflagrar certames licitatórios e regular disposições mais específicas quanto à execução contratual, este não pode agir com excesso de poder, que, conforme conceitua Meireles [3], caracteriza-se “quando a autoridade, embora competente para praticar o ato, vai além do permitido e exorbita no uso de suas faculdades administrativas”, o que torna o ato “arbitrário, ilícito e nulo”.

Nesse sentido, por exemplo, caso o edital preveja a obrigatoriedade de ausência de carência para os servidores que ingressarem ao plano por prazo indeterminado após a assinatura do contrato administrativo, a imposição, independentemente de ter sido impugnada ou não durante o certame licitatório, é nula em razão de já ter nascido viciada, pois a autoridade que deflagrou o edital extrapolou os limites de sua competência.

As carências estão previstas expressamente na Lei nº 9.656/1998, responsável por dispor acerca dos planos e seguros privados de assistência à saúde, e não podem ser desrespeitadas de forma discricionária pela autoridade, sob pena de que prejudique toda a logística relacionada ao equilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo celebrado entre as partes.

É importantíssimo notar que as normativas da ANS não se sobrepõem ou invalidam as disposições legais que regem certames licitatórios, mas, ao contrário disso, possibilitam que a execução do objeto licitado em questão seja realizada de acordo com as diretrizes necessárias à realidade deste mercado regulado e permita que a atividade administrativa seja exercida com a probidade necessária.

Portanto, a conclusão a que se chega é a de que é nula previsão constante em contrato administrativo que preveja obrigação de forma diversa às disposições impostas pela ANS, mesmo que o ponto não tenha sido impugnado em sede do certame licitatório. Afinal, a disposição em específico já nasceu viciada em razão do excesso de poder praticado pela autoridade que deflagrou o certame.

Henrique Quaresma é advogado e pós-graduando em Direito Administrativo na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

Consultor Júridico

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