O ministro Dias Toffoli, do STF (Supremo Tribunal Federal), determinou a suspensão nacional do processamento de todas as execuções trabalhistas que versem sobre a questão controvertida no Tema nº 1.232 da Gestão por Temas da Repercussão Geral, até o julgamento definitivo do Recurso Extraordinário nº 1.387.795 MG.
A controvérsia compreende a possibilidade ou não de inclusão de empresa integrante de grupo econômico em execução trabalhista, sem que ela tenha participado da fase de conhecimento, diante do veto imposto pelo artigo 513, § 5º, do CPC.
A tese que dá guarida ao recurso é a de somente se pode deixar de aplicar o artigo 513, § 5º, do CPC se este for declarado inconstitucional, na forma do artigo 97 da CF e da Súmula Vinculante nº 10. Foi essa a tese adotada em decisão unipessoal pelo ministro Gilmar Mendes no RE com agravo nº 1.160.361-SP ao “cassar a decisão recorrida e determinar” a emissão de outra, com “observância da Súmula Vinculante 10 do STF e do artigo 97 da Constituição Federal”.
O eixo da discussão, entretanto, parece-me desfocado.
A aplicação de regras do CPC no processo do trabalho não é direta, mas subsidiária ou supletiva (CPC, 15; CLT, 769 e 889). A omissão (total ou parcial) de regras processuais trabalhistas, por isso, não atrai a aplicação automática das regras do CPC, que devem passar, também, pelo exame da compatibilidade (CLT, 769).
É isso que proclamam não só a doutrina e a jurisprudência da Justiça do Trabalho, mas as dos demais ramos que utilizam subsidiária e supletivamente as regras do CPC, como, por exemplo, o TSE:
Nos termos do parágrafo único do artigo 2° da Res.-TSE n° 23.478/2016, “a aplicação das regras do Novo Código de Processo Civil tem caráter supletivo e subsidiário em relação aos feitos que tramitam na Justiça Eleitoral, desde que haja compatibilidade sistêmica (MS – Agravo Regimental em Recurso em Mandado de Segurança nº 9486 – RIO DE JANEIRO – RJ – Acórdão de 28/06/2016).
O TSE (Tribunal Superior Eleitoral), ao editar a Res.-TSE 23.478, limitou-se a se pronunciar sobre a compatibilidade das novas regras do Código de Processo Civil à Justiça Eleitoral, levando em conta que a aplicação de tal diploma legal aos processos eleitorais é subsidiária (AI – Agravo Regimental em Agravo de Instrumento nº 122437 – PASSABÉM – MG – Acórdão de 14/03/2019).
Assim, para concluir pela inaplicabilidade do artigo 513, § 5º, do CPC no processo do trabalho não há necessidade de declarar a sua inconstitucionalidade (que, inclusive, não existe). Não fosse assim, a Justiça do Trabalho e a Justiça Eleitoral teriam de declarar a inconstitucionalidade (inexistente) de vários dispositivos do CPC (ex.: arrolados no artigo 2º da IN-TST n. 39/2016) que reputam, apenas, incompatíveis com a ordem processual trabalhista e eleitoral.
O artigo 513, § 5º, do CPC não é inconstitucional. Além disso, é compatível com a ordem processual trabalhista, exceto na hipótese de grupo econômico. Nessa situação específica, o empregador é o grupo – o vínculo jurídico se forma com um ente abstrato — e todos os seus integrantes se subordinam às normas e aos riscos dessa figura jurídica (CLT, 2º, § 2º; Súmula TST nº 129).
O que se deve debater, portanto, não é a aplicação ou não do artigo 513, § 5º, do CPC, mas o meio pelo qual se deve oportunizar o contraditório prévio aos atos de invasão patrimonial (CF, 5º, LV; CPC, 9º, caput).
Soluções viáveis seriam a “aplicação analógica”: a) do artigo 792, § 4º, do CPC que determina o contraditório prévio à declaração de fraude à execução, a fim de que o terceiro adquirente do bem ofereça as suas razões. Nesse caso o debate será travado em embargos de terceiros; b) do art. 135 do CPC que determina o contraditório prévio ao afastamento da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, a fim de que o sócio ou a pessoa jurídica ofereçam as suas razões. Nesse caso o debate será travado nos autos da execução, em incidente de cognição.
Esperemos, então, que o Supremo Tribunal Federal atente para o foco adequado e resolva com sabedoria a questão jurídica afetada.
Júlio César Bebber é juiz do Trabalho e doutor em Direito do Trabalho pela USP.