Justiça manda suprimir reportagens sobre Lira e Médicos pelo Brasil

A Justiça do Distrito Federal determinou a retirada do ar de duas reportagens sobre supostas agressões do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), contra sua ex-mulher, Jullyene Lins. E também mandou a revista piauí suprimir trecho de texto sobre a atuação do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nos programas Mais Médicos e Médicos pelo Brasil.

Decisões judiciais determinam

retirada do ar ou supressão de notícias

pixabay

No caso de Lira, foram ao menos três processos até o momento, movidos contra ICL Notícias, Agência Pública e UOL. Uma quarta ação levou à supressão de entrevista publicada no Congresso em Foco, ainda que o processo tenha sido movido contra o UOL.

Já no caso da piauí, o processo foi ajuizado por um casal citado na reportagem, que solicitou a retirada dos seus nomes. Na prática, a decisão pode levar ao recolhimento da revista das bancas.

Não há decisões em todos os processos. Na ação do site Congresso em Foco, houve a concessão de uma liminar pelo juiz Jayder Ramos de Araújo, da 10ª Vara Cível de Brasília, determinando a retirada do ar de uma entrevista da ex-mulher de Lira e que ela se abstenha de dar novas declarações contra o presidente da Câmara.

O processo está em sigilo. Nele, Lira pede indenização de R$ 100 mil por danos morais à ex-mulher. Nessa ação, também figura como parte não o Congresso em Foco, mas o UOL, que hospeda o site do jornal digital. Segundo apurou a revista eletrônica Consultor Jurídico, o UOL vai recorrer com o argumento de que é parte ilegítima, já que não tem relação editorial com o Congresso em Foco.

A ordem foi dada ao UOL, que não pode retirar do ar conteúdos publicados no Congresso em Foco. Após conversa entre os dois veículos, o segundo apagou a publicação da entrevista.

Na decisão, Jayder afirmou que não cabe “nenhum tipo de censura a matérias jornalísticas” que narram “a prática de crimes contra as mulheres no âmbito de relações domésticas”. No entanto, o juiz argumentou que Lira foi absolvido pela 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal das acusações de agressão. 

“Diante da absolvição do autor, com trânsito em julgado, apoiada no próprio relato da vítima, onde ela firma que não foi agredida pelo autor, deve ser reconhecida que a matéria jornalística traz relato inverídico e gera, injustamente, danos à honra e imagem do autor.”

“O Congresso em Foco excluiu o texto da página, assim como os posts nas redes sociais relacionados ao assunto, tão logo tomou conhecimento da decisão judicial, que previa pagamento diário de multa em caso de descumprimento”, informou sobre o caso o veículo.

No processo contra o ICL Notícias, o juiz Gustavo Fernando de Sales rejeitou a retirada do ar de vídeos envolvendo a suposta agressão de Lira e negou solicitação para que o jornal fosse proibido de fazer novas postagens com “citações caluniosas” da ex-mulher do presidente da Câmara. Na decisão, ele disse não ver “presentes os requisitos autorizadores” para a concessão de tutela de urgência. 

“A história mostra que a imprensa livre e independente é um requisito imprescindível para o estado democrático de direito, lançando luzes sobre questões importantes ao interesse público, sobretudo quando atua de forma séria, ética e livre”, afirmou. O juiz também disse não ver, “de plano, violação a direitos de personalidade” (clique aqui para ler a decisão).

Em nota, o ICL Notícias criticou Lira e classificou o episódio como uma “tentativa de censura”. “Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados, tenta amordaçar o ICL na Justiça para calar a nossa voz. É inadmissível que o presidente de um dos poderes do país use a força do cargo para tentar destruir a imprensa independente.”

No caso da Agência Pública, Lira entrou com uma ação contra o site e contra a ex-mulher. Ele requer que as redes sociais retirem do ar, sob pena de multa diária, o conteúdo de uma reportagem publicada em 21 de junho em que Jullyene diz ter sido agredida.

Ele solicita ainda que a Pública seja impedida de veicular outras publicações com o mesmo teor, também sob pena de multa. Por fim, pede que o site seja condenado ao pagamento de indenização de R$ 100 mil. Ainda não há decisão no processo, que tramita na 14ª Vara Cível de Brasília.  

“Em nosso entendimento, trata-se de um grave ataque à liberdade de expressão e de imprensa no Brasil. O processo corre na 14ª Vara Cível de Brasília contra a Pública e a ex-esposa, Jullyene Lins”, disse a Agência Pública em texto publicado em seu site

Mais Médicos

No caso envolvendo a revista piauí, houve decisão determinando a supressão de dois nomes citados na reportagens. O texto narra a atuação do governo Bolsonaro para desidratar o programa Mais Médicos e supostas irregularidades em seu substituto, o Médicos pelo Brasil.

A reportagem, publicada na edição de junho deste ano, traz relatos de que haveria nepotismo e assédio moral envolvendo a agência responsável pelo Médicos pelo Brasil. A parte suprimida cita um casal contratado pela agência. Foi esse casal que acionou a Justiça pedindo a retirada de seus nomes e que a revista fosse proibida de fazer novas menções a eles em textos futuros. 

Em primeira instância, o juiz Hilmar Castelo Branco Raposo Filho, da 21ª Vara Cível do Distrito Federal, considerou “plausível” o argumento do casal de que a reportagem causava “dano à honra”. Também disse que não foi possível verificar se “a matéria questionada” seguiu “parâmetros éticos da atividade” jornalística. 

“Analisando os autos verifico que os fundamentos apresentados pela

parte são relevantes e amparados em prova idônea, eis que apresentadas

telas dos conteúdos questionados não foi possível verificar que a matéria

questionada tenha seguido os parâmetros éticos da atividade. Em que pese a denúncia realizada, a parte autora não foi ouvida acerca dos fatos e

tampouco houve oferta de espaço para a versão da pessoa atingida”, escreveu o juiz (clique aqui para ler a decisão).

A piauí recorreu da decisão, mas o desembargador Robson Teixeira de Freitas, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, manteve a decisão de primeira instância. Ele entendeu que a revista não apontou de forma clara e objetiva o risco de demora que justificaria a concessão de liminar (clique aqui para ler a decisão). 

Em texto publicado em seu site, a piauí também classificou o caso como “censura”. 

Associações reagem

Entidades do jornalismo criticaram as decisões e o que chamaram de “ataques judiciais” contra veículos de imprensa. A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) disse que Agência Pública, Congresso em Foco, ICL, UOL e piauí “forram submetidos à censura por meio de ações”. 

“A Associação Brasileira de Imprensa lamenta que os magistrados de instâncias inferiores estejam em desacordo com o entendimento da principal corte do país que em várias decisões e manifestações já se posicionou contra qualquer tipo de censura”, diz trecho da nota.

Outras nove associações assinaram nota conjunta contra o que consideraram uma “tentativa” por parte de Arthur Lira de “silenciar meios de comunicação”. 

“Para as organizações abaixo listadas é inadmissível que o presidente da Câmara dos Deputados, um dos poderes que devem zelar pelos preceitos constitucionais, faça uso do Judiciário para cercear conteúdos jornalísticos que lhe desagradam”, diz o texto. 

Assinam a nota a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji); o Repórteres sem Fronteiras; a Associação de Jornalismo Digital (Ajor); o Instituto Vladimir Herzog; a Federação Nacional de Jornalistas (Fenaj); a Rede Nacional de Proteção de Jornalistas e Comunicadores; o Instituto Palavra Aberta; o Instituto Tornavoz; e o Coletivo Brasil de Comunicação Social (Intervozes). 

Consultor Júridico

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