A Encol S/A, que já foi considerada uma das maiores construtoras da América Latina, faliu em 1999. A expectativa de todos os credores (trabalhistas, fornecedores e tributários) era que, liquidados os ativos, os recursos do caixa da massa falida fossem rateados para pagar dívidas trabalhistas. Caso sobrassem recursos, os demais credores seriam contemplados, como preconiza a lei. Todavia, 24 anos depois, a massa falida acumulou um caixa que ultrapassa R$ 220 milhões e pagou cerca de 40% a 50% do que os ex-trabalhadores tinham direito.
Esse caixa foi construído por meio de leilões dos bens da Encol e ações indenizatórias. Mas o resultado dessa eficiência só tem um ganhador: a própria gestão da massa. Afinal, aplicados no mercado financeiro, os recursos geram rendimentos para os administradores da massa falida, que recebem 5% dos ganhos, conforme a legislação.
Por outro lado, se o caminho for a quitação dos créditos trabalhistas pendentes, dá-se por concluída a falência — trabalhadores recebem, gestores ficam sem rendimentos e viramos essa página da história. Essa constatação talvez explique o desinteresse em por fim ao caso. O atual síndico já recebeu em torno de R$ 6,5 milhões como remuneração, desde 2018; o anterior ganhou R$ 30 milhões ao longo de 15 anos.
Há que se considerar também questões processuais que contribuíram para o adiamento de um desfecho dessa causa. Ação revisional de 2015, por exemplo, determinou que fossem reclassificados os credores para quitação dos créditos em aberto. Como resultado, milhares de ex-trabalhadores entraram novamente na Justiça com ações revisionais para buscar a parte anterior, indevidamente cortada.
Em 2019, a Corte Especial do Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) aplicou o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), do IBGE, como índice de correção dos créditos. O atual síndico recorreu dessa decisão para manter a correção pela TR (taxa referencial). Em março de 2022, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) decidiu em favor dos ex-funcionários ao determinar a correção pelo INPC.
Diante disso, a expectativa era que, enfim, o processo falimentar estivesse próximo ao desfecho. Nada! Em novembro de 2022, nova decisão da Justiça determinou o reinício dos pagamentos, mas agora em “duas etapas”, condicionando o início da segunda à quitação integral dos credores da primeira. A decisão, entretanto, não apontou critérios objetivos que determinassem o fim de uma fase e o início da subsequente.
O pagamento da primeira etapa pode demorar anos ou até décadas para ser concluído, pois se algum credor não comparecer para receber ou não buscar seus direitos, isso impedirá o início da segunda etapa. Mais ainda: a Justiça determinou que os credores receberão, na primeira etapa, um teto de até R$ 25 mil. Os que têm valores superiores a essa faixa, como é o meu caso, ficariam para a segunda e receberiam no máximo de 42,44% do saldo remanescente.
Ora, entendemos que essa decisão fere o princípio da isonomia positivado no artigo 5º da nossa Constituição, assertivo ao dispor que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza.
É sabido que o saldo da massa falida não é suficiente para quitar 100% dos créditos trabalhistas. Mas hoje o custo operacional para administração da massa está na casa dos R$ 300 mil mensais, recursos esses que poderiam colocar comida na mesa e comprar medicamentos para os ex-trabalhadores, a maioria idosos — 15% deles já falecidos.
Nesta segunda-feira (8/5), a falência da Encol volta à apreciação do TJ-GO. Trata-se de um julgamento delicadíssimo, cujo desfecho selará o destino de milhares de trabalhadores. Nas condições atuais, os credores apartados para a segunda etapa precisarão aguardar ainda pelo menos dez anos para receber seus direitos. Daí o pedido feito pela Associação dos Credores Trabalhistas da Encol S/A (ABCTE), da qual sou presidente, para que os desembargadores determinem o imediato pagamento de todos os ex-funcionários.
Luiz Eloy Oliveira é ex-funcionário da Encol S/A, presidente da ABCTE (Associação Brasileira dos Credores Trabalhistas da Falência da Encol), entidade que representa aproximadamente 4,5 mil dos mais de 8,2 mil credores trabalhistas.