Não cabe ao juiz impedir Defensoria de cobrar honorários irrisórios

O Judiciário não tem o poder de negar seguimento a um cumprimento de sentença requerido pela Defensoria Pública para cobrar honorários de sucumbência em valores tão baixos que sequer superariam os custos do processo e os gastos para movimentar a máquina pública.

R$ 58,37 cobrados na execução iriam para fundo para aparelhamento da Defensoria

Freepik

A conclusão é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que deu provimento ao recurso especial da Defensoria Pública do Tocantins para autorizar que o ajuizamento de cumprimento de sentença para cobrar honorários no valor de R$ R$ 58,37.

O precedente é importante para a atuação das Defensorias de todo o Brasil, uma vez que os valores cobrados a título de sucumbência vão para fundos geridos por elas próprias para aparelhamento e capacitação profissional de seus membros e servidores.

O caso concreto trata de honorários relativos a uma ação de alimentos em que o réu foi julgado à revelia. No cumprimento de sentença, a Defensoria Pública do Tocantins buscou cobrar verba de R$ 58,37. A Justiça Estadual negou seguimento ao pedido.

O julgamento foi resolvido após o voto de desempate do ministro Humberto Martins. Venceu a posição da relatora, ministra Nancy Andrighi, acompanhada pelo ministro Moura Ribeiro.

Para eles, não cabe ao Judiciário impedir a cobrança de honorários por execução de sentença. Não há lei que autorize nem critérios definidos para quais hipóteses isso seria cabível

Vale a pena?

A solução do caso passou por uma discussão sobre política judiciária e racionalidade no uso de recursos públicos. Ficaram vencidos os ministros Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Aurélio Bellizze, que classificaram a ação da Defensoria Publica no caso como irracional.

Cueva destacou que, a partir da Lei Complementar 132/2009, as Defensorias se organizaram em núcleos e centrais para cobrar e gerir valores de sucumbência. E assim definiram parâmetros e critérios, o que inclui até abrir mão de tais montantes em determinados casos.

Para ministra Nancy Andrighi, não cabe ao Judiciario se imiscuir na decisão da Defensoria de cobrar os honorários

Gustavo Lima/STJ

“Postular um cumprimento de sentença de R$ 57,37 configura, assim, uma escolha irracional, porque leva o estado a movimentar a máquina judiciária para cobrança de um valor que não supera os próprios custos do processo, o que vai de encontro com a boa utilização de recursos e desconsidera consequências práticas da conduta, quando há alternativas mais eficientes”, defendeu.

Segundo a ministra Nancy Andrighi, ainda que as Defensorias possam decidir como e quando cobrar honorários de sucumbência, não cabe ao Judiciário se imiscuir nesse assunto. Principalmente para retirar delas a única possibilidade coercitiva para receber tais valores.

Em sua análise, impedir a cobrança traria onsequências para o sistema de Justiça. Uma delas é gerar uma explosão de manifestação da devedores apontando que os valores que devem são bastante reduzidos e, por isso, não devem ser cobrados judicialmente.

Isso colocaria todo o Judiciário na posição de ter de definir qual é o custo mínimo do processo suficiente para permitir uma execução, inclusive por critérios sociais, econômicos ou regionais para separar as causas passíveis de execução.

Ainda de acordo com a relatora, não são raros os casos em que a Defensoria Pública, na qualidade de representante dos hipossuficientes, tem direito a honorários de sucumbência de valores módicos. Tirar a possibilidade de executar esses valores causará impacto financeiro.

Ministro Cueva entende que ajuizar ação para cobrar R$ 58 é escolha irracional

Emerson Leal/STJ

Política pública

Para o ministro Cueva, nenhum desses argumentos justifica a falta de racionalidade em gastar mais dinheiro para cobrar um valor em favor de um órgão que do próprio Estado. “O verdadeiro acesso à Justiça àquele que a necessita só é garantido se houver uso racional da máquina”, defendeu.

A ministra Nancy Andrighi concorda que realmente deve haver uma solução melhor para a gestão das finanças públicas do que executar uma sentença para receber R$ 58,37. Ainda assim, avalia que não cabe ao Poder Judiciário fazer dessa definição, sem lei que autorize nem estudos técnicos.

“Será o processo o local correto para formulação de política pública?  O voto divergente traz um estudo sobre racionalidade e sobre o custo do processo. Penso que estaríamos tratando do problema em local inadequado”, concordou o ministro Marco Aurélio Bellizze. “Não estaríamos resolvendo um problema com essa decisão e, talvez, criando tantos outros”, complementou.

Ao desempatar o julgamento, o ministro Humberto Martins apontou que a discussão sobre valores ínfimos ou exagerados acaba por desconsiderar o trabalho feito pelo Defensor. “Ele tem que receber por aquilo que produz, seja causa de valor pequeno ou grande”.

Ainda apontou que a posição da divergência traz um risco, por desconsiderar a coisa julgada que impõe uma condenação ao pagamento de honorários de sucumbência. E acrescentou que tais valores serão uteis à Defensoria. “De pouco em pouco a galinha enche o papo”, disse.

REsp 2.041.163

Consultor Júridico

Facebook
Twitter
LinkedIn
plugins premium WordPress

Entraremos em Contato

Deixe seu seu assunto para explicar melhor