Opinião: Sentenças arbitrais e a Lei de Registros Públicos

Com a entrada em vigor da chamada Lei de Arbitragem (Lei nº 9.307/1996), foi revogado o artigo 1.097 do Código de Processo Civil de 1973, que até então exigia que a sentença arbitral fosse homologada pelo Poder Judiciário para produzir os mesmos efeitos de uma sentença judicial.

O artigo 18 da Lei de Arbitragem estabelece que o árbitro é juiz de fato e de direito. E o artigo 31 da mesma lei atribui à sentença arbitral os mesmos efeitos da sentença judicial, não estando sujeita a homologação pelo Poder Judiciário.

Assim, o ordenamento jurídico brasileiro não deixa dúvida quanto ao caráter jurisdicional da arbitragem. Mas a prática revela que vários órgãos com funções registrais, como Juntas Comerciais e Registros de Imóveis, muitas vezes se opõem ao cumprimento de decisões arbitrais, por negarem seu caráter jurisdicional ou por entenderem necessária uma chancela judicial.

A questão que se coloca então é a seguinte: os órgãos com funções registrais (como Juntas Comerciais e Registros de Imóveis) têm o dever de cumprir prontamente as decisões arbitrais que lhes são dirigidas, independentemente de ordem emitida pelo Poder Judiciário?

Para responder a tal questão, frequentemente de grande importância para empresas que se encontram em disputas arbitrais, é preciso ter em mente que, como visto, o árbitro é juiz de fato e de direito e suas decisões não carecem de homologação judicial para produzir os mesmos efeitos daquelas proferidas pelo Poder Judiciário.

O artigo 167, II (12), da Lei nº 6.015/1973 (Lei de Registros Públicos) prevê que será feita no Registro de Imóveis a averbação “das decisões, recursos e seus efeitos, que tenham por objeto atos ou títulos registrados ou averbados”.

O Enunciado nº 9 do Centro de Estudos Judiciários da Corregedoria da Justiça Federal dispõe que “a sentença arbitral é hábil para inscrição, arquivamento, anotação, averbação ou registro em órgãos de registros públicos, independentemente de manifestação do Poder Judiciário”.

Dois aspectos relevantes de tal enunciado devem ser destacados, contando com amparo na doutrina especializada. Primeiro, a sua redação é ampla o suficiente para admitir a aplicação dessa diretriz para todos os serviços registrais, não se limitando aos Registros de Imóveis. Segundo, embora o enunciado faça referência a “sentença arbitral”, é certo que o mesmo tratamento deve ser dado a outras decisões proferidas no curso de uma arbitragem, equiparáveis às decisões interlocutórias do processo civil comum.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) já reconheceu que a referência feita a “carta de sentença” no artigo 221, IV, da Lei de Registros Públicos contempla também aquela proveniente de uma sentença arbitral (conforme resposta à Consulta nº 0008630-40.2021.2.00.0000).

Cabe ainda destacar que, em geral, as determinações de anotações em registros públicos têm eficácia constitutiva. E isto as diferencia dos provimentos de natureza condenatória, os quais, em tese, podem ter a sua efetividade dependente do poder de coerção conferido ao Poder Judiciário.

Os pontos aqui brevemente tratados têm sido considerados pela doutrina especializada, e mesmo em processos judiciais, com manifestações a afirmarem que a melhor interpretação das normas vigentes no sistema jurídico brasileiro é a de que os órgãos registrais estão, sim, obrigados a cumprir prontamente as decisões arbitrais, independentemente de prévia chancela pelo Poder Judiciário.

Levar em conta o acima exposto parece-nos de grande importância na definição de estratégias para disputas arbitrais que envolvam necessárias providências junto a órgãos com funções registrais.

Mario Felippe de Lemos Gelli é sócio de Solução de Conflitos do BMA Advogados.

Consultor Júridico

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