Com pequenos ajustes e melhorias, o Tribunal Superior Eleitoral aprovou nesta quinta-feira (23/3) o texto da Resolução 23.709/2023, que disciplina o procedimento de execução e cumprimento de decisões da Justiça especializada que tenham como consequência a imposição de multas.
Como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, o texto inova ao conferir ao Ministério Público Eleitoral a legitimidade para executar as sentenças nos casos em que a Advocacia-Geral da União não manifestar interesse. Além disso, prevê um novo sistema de controle e acompanhamento dos pagamentos.
Advogados eleitoralistas consultados pela ConJur veem na iniciativa um saldo positivo. Segundo eles, a regulamentação consolida uma disciplina que, até então, estava espalhada em diversas leis. Com isso, deverá facilitar a cobrança, gerar um aumento de arrecadação, simplificar o pagamento e oferecer segurança jurídica.
Atualmente, não há grande controle sobre o pagamento das punições financeiras por descumprimento de obrigação eleitoral, violação das leis sobre o tema e desobediência a ordens judiciais emitidas por juízos eleitorais.
As alterações decorrem de relatório preparado por um grupo de trabalho instaurado no TSE em 2018 e coordenado pelo então ministro Tarcísio Vieira de Carvalho. Esses procedimentos foram discutidos pelo Plenário num espaço de mais de dois anos e, ainda assim, reajustados nesta quinta pela atual composição da corte.
Como funciona hoje
Na sistemática atual, a imposição da multa coloca o candidato, partido ou coligação punido em uma situação contraproducente.
Se a parte for diligente, poderá pagar a multa de maneira voluntária e terá como benefício a possibilidade de obter parcelamento direto com o juízo da causa e em condições favoráveis, sem juros ou correção monetária. O pagamento será mensalmente feito por meio de guia de recolhimento da União (GRU).
O problema é que a União não tem o controle do que ingressa no Tesouro. Assim, a parte é obrigada a peticionar todo mês em juízo para apresentar o comprovante de pagamento e a cópia da GRU. Se isso não acontece, a União assume que o pagamento não foi feito. E se ele atrasa por três meses consecutivos, o parcelamento é cancelado.
A alternativa é não pagar voluntariamente e, assim, correr o risco de ser alvo da Advocacia-Geral da União. Se a multa for maior do que R$ 1 mil, ela será inscrita na dívida ativa da União. E se for de mais de R$ 20 mil, poderá ser cobrada pela Procuradoria-Geral da Fazenda por meio de execução fiscal.
Nessa segunda hipótese, a conta fica consideravelmente mais alta: haverá incidência de multa de 10% e a condenação ao pagamento de honorários de sucumbência, por obrigar a máquina da advocacia pública a se movimentar para receber a dívida. Por outro lado, na hipótese de parcelamento, a União vai identificar automaticamente o pagamento — será o fim do peticionamento mensal.
Esse sistema cria um cenário de grande inadimplência, pouco controle e insegurança jurídica. Em regra, as multas eleitorais não têm valor expressivo, então possivelmente a maior parte delas não será perseguida pela AGU, que até então era o único ente habilitado para fazer a cobrança.
Como vai ficar
Nesse ponto, a nova resolução do TSE muda o jogo para melhor em todos os sentidos. Primeiro porque seu artigo 10, parágrafo 1º, indica que cada sanção será paga por meio de GRU com código específico, observando-se o tipo de receita e a espécie.
Ou seja, a União finalmente terá como identificar qual parcela foi paga e por quem. Isso vai facilitar a vida de quem paga a obrigação voluntariamente, mas também vai cortar o trabalho dos servidores encarregados de conferir cada caso. As alterações aprovadas nesta quinta ainda incluíram a possibilidade de pagar a multa por PIX.
Além disso, a resolução dá ao Ministério Público Eleitoral a possibilidade de executar as sentenças que imponham multas nas situações em que a AGU não manifestar interesse. Isso, por si só, vai levar a um aumento de arrecadação do Fundo Eleitoral — exceto nos casos de multas por descumprimento de decisão judicial, quando o valor será entregue ao Tesouro Nacional.
Adicionalmente, em regra o MP não tem direito a honorários de sucumbência, o que pode melhorar também a situação do ente multado no momento em que ele eventualmente se tornar alvo da execução.
Finalmente, o TSE está em vias de implementar um sistema informatizado para assumir o controle de multas existentes, dívidas pagas e entes inadimplentes. Ele terá a funcionalidade de identificar de plano a que multa se refere o recolhimento e dar a baixa de modo automático.
Mudou para melhor
Para Marina Moraes, a consolidação promovida pelo TSE é muito bem-vinda, especialmente porque foi precedida de amplo estudo sobre o tema. “Não acho que as multas eleitorais em valores inferiores a R$ 20 mil sejam irrelevantes para o contexto do erário ou do Fundo Partidário. Elas devem ser executadas mesmo, e é salutar que o Ministério Público Eleitoral possa fazer isso.”
Na opinião de Acacio Miranda da Silva Filho, a informatização no TSE dará celeridade e credibilidade à cobrança, além de facilitar que ela seja feita administrativamente, antes de virar dívida de valor e objeto de execução fiscal.
“Quando aperfeiçoamos a Justiça Eleitoral e os mecanismos eleitorais, estamos dando efetividade ao nosso sistema democrático. Isso, independentemente dos problemas que as pessoas possam apontar, é uma atitude louvável.”
Na visão do presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-TO, Cleydson Coimbra, as alterações são significativas, importantes e acertadas. Inclusive a mais polêmica delas, a insersão do MP Eleitoral na cobrança das multas.
“Primeiro que não se pode negar a preponderância do interesse público na exação das multas eleitorais, pois ligada diretamente à higidez do sistema eleitoral como forma de sancionar aqueles que, de algum modo, violam respectiva legislação”, disse. “Além disso, a maioria das multas é considerada de pequena monta, de modo que inviabilizar a execução desses valores pelo MP Eleitoral poderia levar ao descrédito da Justiça Eleitoral e ao menosprezo dos recursos públicos, o que não é razoável”, acrescentou.
Por sua vez, Rafael Carneiro destacou a manutenção da sistemática de parcelamento das multas pelo TSE. “A experiência mostra que a AGU sempre foi sensível às dificuldades reais das agremiações e, seguidas vezes, concordou com parcelamentos de acordo com a capacidade de pagamento de cada uma. Espero que o MP também tenha essa sensibilidade.”
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Processo Administrativo 0600280-49.2019.6.00.0000