Proposta da PGR sobre dever de revelação pode reduzir contestações

A proposta da Procuradoria-Geral da República para disciplinar o dever de revelação dos árbitros não vai colocar em xeque a credibilidade do instituto da arbitragem no Brasil. E mais: está alinhada às melhores práticas internacionais.

Especialistas afirmam que proposta da PGR para o dever de revelação em procedimentos arbitrais segue padrões internacionais

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Essa é a opinião uníssona dos especialistas no tema ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico sobre o parecer da PGR que propõe a fixação de balizas para a interpretação do artigo 14 da Lei de Arbitragem, que estabelece regras para impedimento, exclusão ou recusa de árbitros, além do seu dever de revelar qualquer fato relacionado a uma possível parcialidade.

O parecer foi produzido a propósito da arguição de descumprimento de preceito fundamental sobre o assunto ajuizada pelo partido União Brasil. Segundo a legenda, o Poder Judiciário vem interpretando incorretamente o dever de revelação dos árbitros em ações anulatórias de sentenças arbitrais, e, com isso, não consegue harmonizar a jurisprudência.

A PGR discorda desse entendimento e sustenta que o dever de revelação é exclusivo do árbitro e que uma eventual falha nessa obrigação não configura parcialidade automática.

Para Carlos Eduardo Pianovski, professor de Direito Civil e de Arbitragem na Universidade Federal do Paraná, a posição da PGR não relativiza o dever de revelação — pelo contrário, ela o reforça. 

“A parcialidade precisa ser demonstrada, a partir da prova de que o fato omitido ensejou repercussão em seu juízo a respeito da decisão sobre o tema em discussão. Com efeito, é constitucional o artigo 14 da Lei de Arbitragem, seja por contemplar a autonomia privada das partes, seja por assegurar, a um só tempo, a higidez do processo arbitral.” 

Pianovski ressalta que, como o dever de revelação é uma obrigação do árbitro, ele pode se sujeitar à responsabilidade civil em casos de omissão consciente ou dolosa de fato que comprometa a sua imparcialidade e independência, viciando, assim, o processo arbitral.

Pedro Almeida, especialista em Contencioso e Arbitragem do escritório GVM Advogados, afirma que o parecer da PGR se alinha às práticas internacionais em matéria de arbitragem comercial.

“Como os procedimentos arbitrais, via de regra, não admitem recurso, os litigantes passaram a tentar ampliar, excessivamente, as hipóteses de cabimento das ações anulatórias. O árbitro tem o dever de revelar fatos que possam gerar dúvida fundada com relação à sua imparcialidade. O problema é que, em muitos casos, a parte vencida tende a elevar a pertinência de informações não reveladas pelo árbitro, para fabricar fundamentos para uma ação anulatória”, argumenta o advogado.

Segundo ele, as práticas internacionais convergem no sentido de que a mera falha no dever de informar, por si só, não é suficiente para ensejar suspeição ou impedimento do árbitro. “Deve ser avaliado o conteúdo da informação omitida, para que seja possível auferir se ela tem o condão de afastar a imparcialidade necessária ao exercício da atividade jurisdicional.”

Opinião parecida tem o advogado Vamilson José Costa, sócio da área de Contencioso Civil do Costa Tavares Paes Advogados. Ele entende que a proposta da PGR será salutar para a arbitragem e, caso aprovada, vai diminuir o número de ações anulatórias.

“O Judiciário tem enfrentado uma verdadeira avalanche de ações anulatórias de sentenças arbitrais, muitas delas sem mérito, fruto de mero inconformismo da parte vencida na arbitragem. Um dos argumentos muito utilizados para fundamentar tais ações anulatórias é justamente a falha no dever de revelação”, explica ele.

Luis Fernando Zenid, sócio do Donelli, Abreu Sodré e Nicolai Advogados — DSA Advogados, destaca que o posicionamento da PGR está alinhado à International Bar Association. A entidade, fundada em 1947, é uma associação internacional de advogados e ordens e sociedades de advocacia. “Isso é importante porque a maioria dos procedimentos arbitrais é sigiloso. Então, mesmo que as partes investiguem, não é possível saber situações de possível conflito de interesses do árbitro que ocorreram nesse tipo de lítigio.” 

Críticas ao partido

Para Gabriela Lotufo, sócia de Contencioso e Arbitragem do BBL Advogados, a proposta da PGR é positiva. Ela critica a postura do partido autor da ADPF de alegar que uma falha no dever de revelação implica parcialidade presumida do árbitro. 

“Caso se fixasse como automático o reconhecimento da parcialidade do árbitro diante de eventual falha no dever de revelação de qualquer fato sem a necessária confirmação de que este seja capaz de interferir na decisão do árbitro, a anulação de sentenças arbitrais seria muito mais fácil e as partes seriam incentivadas ao seu ajuizamento, minando-se a confiança na arbitragem e a segurança jurídica”, disse ela. 

Outro crítico da ADPF é Murillo Preve Cardoso de Oliveira, advogado no escritório Schiefler Advocacia: “Há de se levar em consideração que o próprio modelo do instituto arbitral já autorregula as boas práticas relacionadas à atividade do árbitro. Uma vez que as partes possuem a liberdade para definir os julgadores das suas demandas, um profissional que passe a ser conhecido como um árbitro que não desempenha sua função de forma diligente por certo deixará de ser nomeado para atuar em outros processos arbitrais, sem que para isso seja necessário estabelecer regramentos específicos, como propõe a ação”. 

Maúra Guerra Polidoro, advogada da banca Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados, segue o mesmo caminho. “Se a ADPF 1050 for julgada procedente, gerando regras complexas ou sujeitas a interpretações diversas, é possível que sejam gerados possíveis atrasos nas arbitragens, bem como um maior número de ações anulatórias. Portanto, é aconselhável que seja feita uma análise cuidadosa das vantagens e desvantagens antes que sejam implementadas novas regras.” 

Consultor Júridico

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