A saúde pública não tem como dar conta das necessidades integrais da população brasileira e, por esse motivo, são necessárias parcerias com o setor privado da área suplementar, de acordo com estudiosos do assunto como o ministro Antonio Saldanha Palheiro, do Superior Tribunal de Justiça.
O magistrado participou da mesa “Saúde, governança, sustentabilidade e inclusão social”, que fez parte do XI Fórum Jurídico de Lisboa, evento que reuniu no fim de junho vários dos mais importantes nomes do Direito do Brasil e da Europa.
Segundo o ministro do STJ, investimentos em saúde resultam em maior produtividade laboral.
“Quanto mais você investe em saúde, mais você consegue atingir a produtividade no mercado de trabalho, em geral. A gente vai ter de ter uma integração maior. Não é a saúde pública de um lado e a saúde suplementar e complementar do outro, caminhando cada uma para um lado. Nós temos de buscar uma integração de forma a ver uma sinergia nesses dois tipos de disponibilização de saúde.”
O ministro destacou trabalhos feitos por fundações que, de alguma forma, possibilitam maior acesso à saúde de qualidade aos brasileiros. Ele defendeu a ampliação dos gastos em saúde para a faixa de 7,5% do Produto Interno Bruto, sendo 1% em saúde preventiva.
“Quais são as estratégias comuns dessas fundações que as colocam entre as melhores do mundo em termos de gerenciamento? Gestões e investimentos em inovação, em recursos tecnológicos, colaborações com entidades locais, avaliação constante de custo-benefício e foco em educação e inclusão social.”
Caixa d’água
Diretora-executiva da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), Vera Valente lembrou que o mercado é formado por cerca de 700 operadoras, com uma rede de 420 mil médicos em todo o país. Apesar desses números grandiosos, segundo ela, há problemas relacionados a tecnologias cada vez mais caras, falta de estabilidade regulatória e uma escalada de fraudes contra as empresas, que alcançam o valor de R$ 28 bilhões.
“Gosto de fazer uma analogia de que a saúde suplementar é uma grande caixa d’água. A gente não gera recurso. Nós administramos o recurso do beneficiário e irrigamos toda uma rede de saúde privada. Sem as operadoras, essa rede não existiria. 83% das receitas dos hospitais vêm da saúde suplementar.”
O debate foi mediado pelo desembargador Ricardo Couto, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ). Ao comentar a intervenção de Vera, o magistrado destacou que é importante ter a consciência de que as seguradoras gerenciam os investimentos de terceiros.
“Nós que estamos no campo jurídico, não raras vezes, observamos decisões um tanto quanto liberais, com uma visão muito especial, estabelecendo coberturas amplas de custo altíssimo. Isso vai trazer repercussão para os próprios usuários. No final, nós teremos uma exclusão desses planos pelo alto custo que nós teremos. Então, é de suma importância uma visão econômica e atuarial dos planos de saúde.”
Diretor-presidente da Confederação Nacional das Seguradoras (CNSeg) e ex-ministro do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, Dyogo Oliveira ressaltou que já ficou claro que o Estado brasileiro, como está, não tem capacidade de atender sozinho às necessidades da sociedade. “Isso se reverte contra o próprio Estado, como uma crítica, e contra a própria democracia.”
Ele defendeu a ideia de que sejam ampliadas as parcerias entre o governo e as gestões privadas de saúde: “A possibilidade de parcerias com o setor privado já se desenvolveu em várias outras áreas. Mais recentemente, no saneamento, em que sempre se buscou em modelos públicos a universalização, mas onde se falhou plenamente. Agora, através de processos de concessão de parcerias com setor privado, começa a crescer o investimento em saneamento na área de infraestrutura. Isso aconteceu há mais de 30 anos. Todos nós chegamos aqui através de um aeroporto concedido ao setor privado, certamente (em alusão ao sistema aeroportuário português). A área da saúde precisa repensar os seus modelos de parcerias público-privadas.”
Já o presidente da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), Paulo Rebello, lembrou que em 2050 o Brasil terá uma população envelhecida. “A cada 101 idosos, serão cem jovens, o que prejudica a lógica do pacto de integrações, porque, também dentro do setor suplementar, os jovens acabam financiando os mais idosos. Isso é uma questão que, de fato, impacta essa nossa sustentabilidade.”
“O fato é que, se nós não chegarmos a um consenso sobre onde o debate vai ser colocado, com o paciente no centro de toda essa discussão, a gente vai ter dificuldade de financiar esse setor”, concluiu Rebello.
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