STF continua a julgar constitucionalidade do juiz das garantias

O Plenário do Supremo Tribunal Federal deu continuidade nesta quinta-feira (15/6) ao julgamento sobre a constitucionalidade da criação do juiz das garantias. A sessão teve sustentações orais dos autores e dos amici curiae. O julgamento deverá ser retomado na próxima quarta (21/6).

Fux suspendeu a implementação do

juiz das garantias no começo de 2020

Carlos Moura/SCO/STF

Ao criar o mecanismo, a Lei “anticrime” (Lei 13.964/2019) buscou reduzir o risco de parcialidade nos julgamentos. Com a medida, o juiz das garantias fica responsável pela fase investigatória e o juiz da instrução, pelo andamento do processo e pela sentença. Entre as atribuições do juiz das garantias, está decidir sobre o requerimento de prisão provisória ou outra medida cautelar e sobre a homologação de acordo de colaboração premiada. A competência do julgador acaba com o recebimento da denúncia ou queixa.

A partir desse momento, o juiz da instrução assume o caso e, em até dez dias, deve reexaminar a necessidade das medidas cautelares impostas pelo juiz das garantias. E o julgador que, na fase de investigação, praticar atos privativos da autoridade policial ou do Ministério Público ficará impedido de atuar no processo.

Os autores das quatro ações diretas de inconstitucionalidade julgadas pelo STF argumentaram que não há como implementar o juiz das garantias segundo o que estabelece a Lei “anticrime”. Em nome da Associação dos Magistrados Brasileiros e da Associação dos Juízes Federais do Brasil, Alberto Ribeiro disse ser impossível criar o mecanismo de um dia para o outro.

Caio Chaves Morau, advogado do partido Cidadania, disse que a implementação do juiz das garantias custaria R$ 2,5 bilhões aos cofres públicos. Como não há previsão orçamentária para essa despesa, seria preciso fazer cortes em programas que efetivam direitos sociais, alegou ele.

Atualmente, 40% das varas das Justiças estaduais são de comarca única, com um só julgador. Assim, o juiz das garantias é incompatível com essa estrutura, opinou Joelson Dias, procurador do Podemos.

Representante do União Brasil, Arthur Rollo questionou como o mecanismo funcionaria na Justiça Eleitoral, no Tribunal do Júri e nos juizados de violência doméstica.

Aristides Junqueira Alvarenga, advogado da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público, destacou que a permissão para o juiz do processo revogar prisão decretada pelo magistrado da instrução é inconstitucional.

Por outro lado, a advogada da União Isadora Arruda afirmou que o juiz das garantias aumenta a imparcialidade. Ela deixou claro que isso não significa que os juízes brasileiros sejam parciais, mas que pode haver perda de imparcialidade em virtude de efeitos psicológicos, como o da dissonância cognitiva.

Preservação de garantias

Representantes de diversos dos 23 amici curiae se manifestaram na sessão. Em nome do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, o criminalista Alberto Zacharias Toron afirmou que o problema do juiz das garantias está no nome. “Se tivessem chamado de ‘serviço de incremento à repressão criminal’, ninguém teria reclamado.” Toron também disse que basta ter vontade política para implementar o mecanismo.

Aury Lopes Jr., advogado da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas e da Associação Juízas e Juízes para a Democracia, disse que o instituto é essencial para concretizar o sistema acusatório estabelecido pela Constituição Federal de 1988. O criminalista também destacou que “a história da ‘lava jato’ teria sido diferente se um mesmo juiz não tivesse atuado do começo ao fim, autorizando medidas cautelares, homologando delações e julgando”.

Representante da Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos, Luís Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho citou dois precedentes do Supremo: a ADC 19 e a ADI 4.414. No primeiro caso, a corte declarou a constitucionalidade dos juizados de violência doméstica. No segundo, validou a criação de vara especializada na Justiça estadual. Ou seja, ressaltou ele, a jurisprudência do STF entende que lei que altera a estrutura do Judiciário não precisa necessariamente ser proposta por tal poder, como sustentam os autores.

“Há uma resistência político-ideológica ao juiz das garantias porque ele coloca freios e limites ao poder do juiz de primeira instância, que se eternizou nas figuras de Sergio Moro e Marcelo Bretas. Ou seja, o juiz que cobra escanteio e corre para cabecear, o juiz que decreta a prisão no inquérito e depois faz de conta de vai julgar com base no contraditório, nos debates”, afirmou o advogado do Solidariedade, Fabio Tofic Simantob, para quem o mecanismo aumentaria a confiança no juiz de primeiro grau.

Maria Elizabeth Queijo, representante do Instituto dos Advogados de São Paulo, disse que o instituto não aumentaria a duração dos processos, pois haverá apenas a divisão das funções. E o fim dos autos físicos acelerou bastante os procedimentos, especialmente as investigações, que eram o grande gargalo da persecução penal, de acordo com ela.

Suspensão do mecanismo

Em janeiro de 2020, menos de um mês após a Lei “anticrime” entrar em vigor, o ministro Luiz Fux, relator do caso, suspendeu a implementação do juiz das garantias. Por mais de três anos, o magistrado não liberou a liminar para análise pelo Plenário — o que gerou críticas de outros ministros. Em maio, o caso entrou na pauta do Supremo.

A corte analisa quatro ações, ajuizadas por entidades de classe da magistratura e por partidos políticos, apontando suposta inconstitucionalidade do juiz das garantias.

As ações afirmam, por exemplo, que a implantação desse juiz deveria ocorrer por meio de lei de iniciativa dos tribunais, e não do Congresso. Também sustentam violação aos princípios do juiz natural e da igualdade.

ADIs 6.298, 6.299, 6.300 e 6305

Sérgio Rodas é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio de Janeiro.

Consultor Júridico

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