A multa por litigância de má-fé, oriunda do processo civil, é inaplicável na esfera penal, por falta de previsão legal. Sua imposição ao acusado configura analogia in malam partem (prejudicial ao réu), medida sabidamente incabível na seara criminal.
Com esse entendimento, o ministro Ribeiro Dantas, do Superior Tribunal de Justiça, deu provimento ao recurso especial de um empresário que, na condição de réu colaborador em um processo penal, foi multado pela Justiça Estadual do Paraná.
O réu firmou acordo de colaboração premiada firmado em que renunciou em favor do Estado aos direitos sobre dois veículos de sua propriedade. Os bens seriam leiloados para ressarcimento de danos e pagamento de multa por crimes de lavagem de dinheiro.
O réu permaneceu como fiel depositário — o responsável por guardar um bem durante um processo judicial — até o leilão, período no qual interpôs recursos para discutir a transferência da posse dos veículos para o leiloeiro nomeado nos autos.
Quando chegou o momento de fazer a transferência, descobriu-se que um dos veículos estava há mais um ano apreendido no pátio da Secretaria Municipal de Trânsito. Segundo a Justiça paranaense, o objetivo era frustrar a realização do leilão e atrapalhar o andamento do processo.
A decisão que aplicou a multa destacou que a mudança de guarda do bem gerou risco de depreciação ao automóvel, podendo vir a frustrar o resultado útil do leilão judicial. O Tribunal de Justiça do Paraná manteve a punição com base em precedente do Supremo Tribunal Federal.
A defesa do réu, feita pelos advogados Tracy Reinaldet, Matteus Macedo e Lucas Fischer de Moraes, levou o caso ao STJ alegando que a multa por litigância de má-fé é incabível no processo penal. A alegação foi acolhida pelo ministro Ribeiro Dantas, conforme jurisprudência da corte.
Segundo o relator, nem mesmo o artigo 3º do Código de Processo Penal, que admite aplicação analógica de outros princípios gerais do Direito, autoriza a punição, pois destina-se a preencher lacunas procedimentos de um código antigo, defasado e remendado.
“O sobredito dispositivo não autoriza, porém, a criação de um gravame gestado no processo civil, algo substancialmente diferente do simples saneamento de omissões da lei processual penal”, afirmou o ministro.
REsp 2.044.230