A lei de iniciativa parlamentar que impõe restrições à nomeação para cargos em comissão não configura ingerência do Poder Legislativo na esfera de atribuição do Executivo.
Com esse entendimento, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo julgou constitucional uma lei de Tanabi, de iniciativa parlamentar, que disciplina as nomeações para cargos em comissão e funções gratificadas no Executivo e no Legislativo, instituindo no município restrições semelhantes às da Lei da Ficha Limpa.
A norma impede a nomeação para cargos em comissão de pessoas que tenham sido condenadas pela Justiça Eleitoral, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado, em processo de apuração de abuso de poder econômico ou político, desde a decisão até o transcurso do prazo de oito anos.
Ao propor a ação, a Prefeitura de Tanabi sustentou que, ao restringir o exercício de uma prerrogativa constitucional do titular de um mandato eletivo, isto é, a nomeação de comissionados, a lei violou a independência e a harmonia entre os poderes. Mas o relator, desembargador Ademir Benedito, não verificou ilegalidades no texto.
“O fundamento invocado pelo prefeito para sustentar a tese de inconstitucionalidade formal do ato normativo ora impugnado, qual seja, ‘não poderia a Câmara Municipal estabelecer condição para a indicação de cargo em comissão, a ser exercido por quem seja depositário da confiança do chefe do Poder Executivo e que é de livre provimento’, invadindo, ‘nitidamente a competência do Executivo’, não se revela idôneo para, por si só, ensejar o pretendido reconhecimento da existência, in casu, de vício de iniciativa.”
O magistrado observou que o vício de inconstitucionalidade formal subjetiva se concretiza apenas na hipótese de invasão, pelo Poder Legislativo, da esfera de competência exclusiva do chefe do Executivo, o que inclui, por exemplo, leis sobre a criação e a extinção de cargos e sobre o regime jurídico dos servidores.
“E, da singela leitura do inciso I do artigo 2º da Lei 2.651/2015, verifica-se que, ao contrário do sustentado pela parte autora, não versa referida norma acerca de qualquer dos assuntos acima relacionados, razão pela qual é impossível entrever, in casu, a ocorrência do propalado vício de iniciativa do ato normativo objurgado”, afirmou ele.
Para Benedito, a lei não trata de atividade de organização da administração pública, mas de condições de acesso ao serviço público em geral, inclusive do Legislativo: “A reserva legislativa do Executivo, prevista no artigo 24, §2º, 1 e 4, da Constituição do Estado, refere-se tão-só à criação e extinção de cargos, funções e empregos no serviço público. Isso significa que a lei pode enunciar termos, condições e especificações, no interior dos quais procederá o chefe do Executivo.”
Divergência
A decisão foi tomada por maioria de votos. Em declaração de voto vencido, o desembargador Evaristo dos Santos apontou vício de iniciativa na lei e disse que, ainda que se justifique o texto com a preservação dos princípios morais na investidura de cargos públicos, cabe somente ao chefe do Poder Executivo estabelecer os critérios e requisitos para tanto.
“A norma em questão, ao proibir a nomeação de determinadas pessoas para cargos comissionados, versou sobre regime jurídico dos servidores públicos, invadindo, inequivocamente, seara privativa do Executivo, caracterizando vício formal subjetivo a ensejar o acolhimento da pretensão”, explicou Santos.
O magistrado também apontou ofensa ao princípio da separação dos poderes por entender que a lei retira a discricionariedade na gestão administrativa local: “Por mais nobre que tenha sido o intuito da lei, não se afigura razoável violar um princípio constitucional (da separação dos poderes), a pretexto de impor outro (da moralidade administrativa)”.
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Processo 2236990-06.2022.8.26.0000